Via Embrapa Pantanal
A plantação feita pelas mãos de moradores da Área de Preservação Ambiental (APA) Baía Negra em Ladário (MS), coordenada pelos pesquisadores da Embrapa Pantanal, é inspirada nos processos ecológicos que acontecem de forma natural no ambiente. Através do Quintal Agroecológico Sucessional, implantado na região em maio do ano passado, foi possível integrar espécies arbóreas e de lavoura em um mesmo espaço (livre de defensivos ou outros produtos químicos agrícolas), utilizando uma grande variedade de plantas para oferecer alternativas alimentares a uma população que sobrevive, tradicionalmente, por meio da pesca.
“Esse sistema imita uma floresta – tanto no espaço que as plantas ocupam quanto no seu ciclo de vida. A nossa atuação serve para orientar os moradores a utilizar esse local de acordo com a lei e com os limites impostos pela legislação (de uma área como a APA Baía Negra), mas também de maneira sustentável, fazendo com que a população obtenha segurança alimentar e alguma renda advinda do local, seja com o turismo ecológico ou com o fornecimento de alimentos exclusivos”, diz a chefe-adjunta de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Pantanal, Catia Urbanetz.
O quintal
Entre as plantas do sistema há tubérculos como batata doce, mandioca, inhame e gengibre. O quintal agroecológico também conta com espécies rasteiras (abóbora, melancia e melão, por exemplo), espécies arbustivas – como o milho e feijão de corda – e de porte mais alto, como banana e melão, além de diversas árvores (entre as frutíferas tropicais estão a acerola, manga, goiaba, caju, bocaiuva, tarumã e seriguela). De acordo com o pesquisador Ubiratan Piovezan, da unidade pantaneira da Embrapa, a área cultivada na APA Baía Negra tem três linhas de plantio com 30 metros de comprimento cada. Do ponto zero ao trinta, árvores foram plantadas de cinco em cinco metros.
“Em cada uma das linhas, vai haver sete árvores frutíferas que vão cumprir a função mais tardia do sistema sucessional, produzindo daqui a cerca de 20 anos”, afirma. Ainda segundo Piovezan, entre essas linhas foram plantadas espécies de ciclo curto (seis meses, em média) como melancias e abóboras. “Também plantamos o feijão junto à cova das mudas de árvores para colhê-los no ciclo curto”, diz. “Em algumas covas, fizemos uma linha de feijão junto com o milho crioulo para que o feijão ´subisse´ no próprio milho. A ideia é essa: aproveitar esse espaço e, enquanto o sistema agroflorestal não está com o dossel das árvores formado, vamos usar esse ambiente para outras produções”.
O pesquisador Alberto Feiden, da mesma instituição, conta que a plantação sofreu ataques de pragas como o caramujo africano e de animais como o pássaro trinca-ferro no processo. “A gente fez um levantamento das espécies arbóreas que conseguiram sobreviver – em torno de 60% a 75% delas, apesar das condições”. Segundo Feiden, as espécies que morreram serão replantadas com o acompanhamento dos pesquisadores, que também irão apoiar outros agricultores interessados em montar os quintais nas suas propriedades. “Eles não têm que seguir, necessariamente, aquele sistema rígido que nós estabelecemos no primeiro quintal. Cada um pode usar as espécies que preferir”.
Quem planta
Julia Gonzales, presidente da associação de moradores da APA Baía Negra, fala com alegria sobre o milho e outras culturas colhidas por meio do trabalho com o quintal agroecológico secessional. “No entender da comunidade, o primeiro quintal implantado foi um sucesso – ainda que a gente esteja em uma área difícil, formada por um aterro”. Para Gonzales, a eficiência do sistema estimulou a sua adoção pela comunidade. “Até então, não tínhamos uma cultura de plantação. A gente viu que esse trabalho levantou um pouco a autoestima do grupo e hoje, encontramos várias plantações bonitas por lá”.
Atuando com a parceria da Embrapa Agropecuária Oeste, a Embrapa Pantanal elabora junto aos moradores da APA Baía Negra o planejamento para as próximas ações do quintal agroecológico com base nas demandas da comunidade. Essas demandas incluem testes de armadilhas para as pragas identificadas até o momento, a elaboração de um minhocário para os pescadores do grupo e uma possível produção de arroz nativo na região. “Na minha percepção, eles também acham que é uma proposta sinérgica à sua aptidão atual”, finaliza Piovezan. “Parecem ótimos parceiros e nesse sentido devem cuidar bem daquela região. Se eles tiverem condições de se manter, serão bons amigos do meio ambiente”.