O Estadão
As companhias chinesas continuam com imenso apetite pelo setor elétrico do Brasil, no qual já caminham para a liderança em alguns negócios, mas o cheque em branco dado por Pequim para aquisições no país não significa que as gigantes orientais farão qualquer negócio ou pagarão preços excessivos pelos ativos.
Prova disso foi o desinteresse na privatização da distribuidora goiana Celg-D – às vésperas do cancelamento do leilão, mercado e governo ainda especulavam se o interesse da chinesa State Grid poderia salvar um fracasso que se desenhava conforme investidores brasileiros criticavam o preço da elétrica.
Segundo as empresas e especialistas próximos, equipes da State Grid e da China Three Gorges (CTG) têm analisado em detalhes cada tentativa de venda de ativos em energia, mas na vantajosa posição de quem tem caixa e tempo para escolher negócios.
“Os chineses estão com maior apetite pelo risco no Brasil, o que não quer dizer que não olhem os riscos com muita atenção. Evidente que eles aceitam um retorno um pouco mais baixo que o investidor brasileiro, mas também não estão rasgando dinheiro”, disse o sócio da consultoria Upside Finance, Humberto Gargiulo, que já apoiou a State Grid antes em leilões de transmissão.
O avanço das chinesas rumo ao exterior tem como pano de fundo o interesse em criar mercados para fabricantes de equipamentos e empresas de engenharia chinesas, além de aumentar a influência global do país. No Brasil, o interesse é maior ainda devido às características do sistema, que guarda semelhanças com o chinês por recorrer a grandes hidrelétricas e imensas linhas de transmissão.
“Nós temos o objetivo de ser um player relevante, mas, para crescer, nós precisamos que isso faça sentido, depende das oportunidades no mercado. Há muitas oportunidades e potenciais compras que estamos analisando”, disse o presidente da CTG Brasil, Li Yinsheng.
De acordo com o executivo, a companhia tem uma equipe de seis pessoas no país e mais especialistas na China que analisam negócios o tempo todo, e que não há limites ou metas definidas para investimentos.Ele ressaltou que a preferência é por energia renovável, e estão no foco tanto compras de ativos em operação quanto novos projetos. “Nós estamos no mercado para o longo prazo, esse é nosso racional de investir no Brasil. Você pode imaginar que se uma companhia toma 20 anos para tomar a decisão de vir, só podemos assumir que veio para ficar por um longo tempo no mercado.”
Já a State Grid estreou no Brasil em 2010 com a aquisição de US$ 1 bilhão em ativos de transmissão e desde então entrou em grandes projetos no país. Já a CTG olhava o País há 20 anos, mas decidiu entrar de vez em 2013. Desde então, fez aquisições de R$ 16 bilhões.
Procurada, a State Grid não quis falar de sua estratégia.
Negócios no radar. Segundo uma fonte que acompanha as negociações, a CTG tem uma visão de liderar o mercado de geração no médio prazo, e participa da análise da eventual compra de ativos da americana Duke Energy no país, da geradora de energia limpa Renova e de parques eólicos da Queiroz Galvão Energia.
Já a State Grid estuda a possível compra de ativos de transmissão de energia das espanholas Abengoa e Isolux. Também foi oferecida a essas empresas fatia na hidrelétrica de Santo Antônio, que está sendo construída em Rondônia por um grupo que inclui Cemig, Odebrecht e Andrade Gutierrez, além de Furnas, da Eletrobrás.
Além disso, a State Grid tem uma due dilligence em andamento para a aquisição da fatia da Camargo Corrêa na CPFL Energia, em um negócio que pode superar R$ 25 bilhões. Em entrevista recente à Reuters, o presidente da CPFL, André Dorf, disse que, se assumirem a companhia, os chineses estarão prontos para investimentos ou aquisições em todos segmentos da energia – geração, transmissão, distribuição e comercialização. “Eles vão fazer bastante coisa ali”, afirmou à Reuters uma fonte próxima dos chineses, que vê grande espaço para consolidação o setor de energia do Brasil.