Fazendeiros do Pantanal estão apostando em búfalos como forma de proteger seus rebanhos bovinos de ataques de onças pintadas. E o bioma pode pagar por isso.
Isso porque bovinos são mansos –ou seja, presas mais fáceis. Já os búfalos reagem aos ataques, em bando. A ideia, portanto, é colocá-los junto ao gado e às matas ciliares de rios, criando uma barreira de proteção.
Foi o que fez a fazenda Porto Jofre, no Pantanal de Mato Grosso, onde os peões recolhem todas as noites o rebanho de 300 cabeças de nelore em uma área de cinco hectares para dormir. Junto a ele, vão 20 búfalos.
“Eles cuidam bem do meu gado”, diz Eliseu Evangelhista, proprietário da fazenda.
Eliseu acredita que, graças aos búfalos, deixou de perder cerca de 70 bezerros por ano por predação das onças. “Mexo com eles todos os dias, senão fogem. Na região, tem várias propriedades que perderam o controle e os búfalos se tornaram selvagens”, conta.
Esse é o perigo. No Pantanal, bandos selvagens não têm predadores. Se saírem do controle, as populações podem crescer sem limites, além de arredios, são apontados por cientistas como reservatórios de doenças e responsáveis por assoreamento de rios.
Mais fortes e pesados do que os bovinos, búfalos estouram cercas com facilidade e nadam muito bem. “Basta um descuido para que os animais fujam. Essa é a origem das populações de búfalos asselvajados no Pantanal”, conta o pesquisador Walfrido Tomás, da Embrapa.
Outro problema é que eles nem sempre são dóceis.
Ivanildo Miranda, empresário e pecuarista há 35 anos no Pantanal de Mato Grosso do Sul, conta que, um dia, após chegar em sua fazenda de avião, foi surpreendido ao saber que um de seus búfalos mansos arrebentou a cerca da pista de pouso e começou a dar chifradas no avião estacionado.
“O avião parado e o búfalo lá, dando cabeçada e chifrada! Esse bicho não é fácil.”
Os búfalos selvagens são ainda mais agressivos.
Em setembro deste ano, Anorvo Gomes da Silva, 59, morreu após ser atacado por um búfalo asselvajado na fazenda em que trabalhava como peão, no Pantanal de MS.
“São muitos búfalos selvagens aqui. Depois do acidente do meu pai, um peão pediu as contas, porque tem medo. Esse não é um caso isolado. Se as autoridades não tomarem providência, a tendência é só piorar”, diz Edezio Gomes da Silva, 33, filho de Anorvo.
O animal o atacou enquanto ele e outros três peões andavam a cavalo em uma mata densa. A investida matou o cavalo no local e perfurou o abdome de Anorvo, que morreu após sete dias.
Segundo especialistas, os búfalos ficam mais mansos se manejados diariamente, mas no Pantanal o sistema intensivo de criação de gado não faz parte da cultura. Bovinos são criados soltos nos pastos, e têm contato com o homem poucas vezes durante o ano.
No Norte, o Amapá tem um problema sério com búfalos selvagens. São mais de 30 mil animais assoreando rios, causando erosões, compactando o solo e competindo com espécies nativas. Não se sabe quantos animais há no Pantanal –a Embrapa fará uma estimativa no próximo ano.
EVIDÊNCIAS
Os especialistas afirmam que não há comprovação de que utilizar búfalos de fato reduza a morte de bois.
“Se a intenção for só proteção do gado, não sei se dará certo. Eles têm um instinto de proteção forte entre eles; mas desconheço que isso possa extrapolar para outras espécies”, diz o veterinário Jaci de Almeida, da Universidade Federal de Minas Gerais. “Eles são mais lentos que bovinos, costumam andar juntos, não dá para impor um ritmo, é preciso trabalhar com calma. Manejo agressivo não funciona e pode pôr todos em risco.”
Os animais têm bom potencial para produção de leite e carne. Na fazenda de turismo San Francisco (MS), há produção de leite de búfala há dez anos. “Os bandos ficam dentro d’água, é uma paisagem bonita, os turistas gostam”, diz Roberto Coelho, dono da fazenda.
Fonte: Fernanda Athas – Folha de São Paulo