A análise do pelo da onça pintada, o maior felino das Américas e que está ameaçado de extinção, pode demonstrar a concentração de mercúrio no organismo do animal. As coletas do pelo da onça, que estão sendo coordenadas pela professora Aurea Ignácio da Universidade do Estado de Mato Grosso para o seu pós-doutorado, utilizam uma metodologia não invasiva e que vem se mostrando altamente eficaz.
Segundo a pesquisadora, as coletas do pelo de diferentes indivíduos são realizadas por meio de armadilhas colocadas em pontos estratégicos da Estação Ecológica de Taiamã em Cáceres e posteriormente no Parque Nacional do Pantanal. “Utilizamos para a coleta de amostras de pelo das onças uma metodologia não invasiva, adaptada de estudos com ursos Kodiac, no Alaska e outros carnívoros ao redor do Mundo, mas que nunca havia sido utilizada com a onça pintada, e que consiste em armadilhas de arame farpado entrelaçado. Cada ponto amostral é monitorado continuamente por uma câmera trap que dispara com a presença de movimento, permitindo a identificação dos indivíduos”.
Aurea explica que as amostras de pelos das onças pintadas que estão sendo recolhidas serão analisadas no Laboratório de Ecotoxicologia do Centro de Liminologia, Biodiversidade e Etnobiologia do Pantanal (Celbe/Unemat) e Laboratório de Radioisótopos da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que possui certificação internacional. A ideia é verificar qual a concentração de mercúrio encontrado nos pelos dos animais e com isso avaliar o nível de contaminação.
Também o estudo irá mensurar a porcentagem de Carbono e Nitrogênio com vistas a estimar o quanto de peixe as onças consomem em sua dieta alimentar. As análises para determinar as porcentagens dos isótopos estáveis, 13C e 15N nas amostras de pelo deverão ser feitas na Oregon StateUniversity, USA.
Dieta
De acordo com a pesquisadora os estudos que estão sendo realizados pelo estudante de mestrado, Manaav Kamath, na Estação Ecológica de Taiamã e no Parque Nacional do Pantanal com onças pintadas já vem mostrando que as mesmas consomem em sua dieta praticamente peixes e jacarés. Em estudos já publicados demonstramos que tanto em peixes como nos jacarés possuem contaminação por mercúrio .
“Nossa pesquisa pretende monitorar se existe risco à saúde desses animais, incluindo a reprodução e a preservação da espécie”, explica Aurea.
A professora da Unemat iniciou os trabalhos de campo com a colocação de sete pontos de armadilhas e câmeras trap na Estação de Taiamã em19 de agosto e desde então já foram realizadas outras três viagens de campo para coleta de amostras. As câmaras e armadilhas estão localizadas em sete pontos distintos. A professora explica que em cada ponto um grupo de animais é monitorado, isso porque os grandes felinos possuem territorialidade, mas a comprovação e a identificação desses animais será confirmada por meio de analise de DNA e manchas específicas de cada indivíduo.
Outro dado interessante da pesquisa, que além de estabelecer uma correlação entre o consumo de peixes e jacarés pelas onças pintadas no Pantanal, área da pesquisa, é demonstrar que o mercúrio na forma orgânica encontrado nessas presas pode ter surgido da exploração de garimpos na região, mas também por processos naturais, no ar, água e solo, sem que tenha sido fruto de ação humana. O Pantanal possui ambientes favoráveis à tornar o mercúrio disponível para a acumulação na cadeia trófica.
Veja o vídeo:
Cooperação Internacional
Áurea explica que o grupo de pesquisadores, que integram uma cooperação internacional entre a Unemat, por meio do Programa de Pós-graduação em Ciências Ambientais e Conselho de Investigação Científica na Espanha já comprovaram a presença de mercúrio de forma natural no Pantanal, o que possibilita que esse poluente acabe se acumulando na cadeia alimentar. Na prática isso quer dizer, que se um peixe come um outro peixe que esteja contaminado com mercúrio, esse poluente se acumula e acaba contaminando quem o comeu, isso vai ocorrer com a onça pintada ou com qualquer outro individuo, incluindo o homem.
Sem riscos
Apesar desse alerta, a pesquisadora da Unemat, afirma que não há porque o homem deixar de se consumir o peixe, incluindo ai os peixes carnívoros. “Contudo, o ideal é mesclar peixes carnívoros com peixes que comem frutos. Dessa forma, é possível controlar os níveis de mercúrio sem correr o risco de alguma disfunção no organismo”. Isso porque os estudos mostram que 12% dos peixes carnívoros tem a concentração de mercúrio acima do recomendado pela Organização Mundial de Saúde. “O peixe é um alimento importante e saudável. O que estamos fazendo é pesquisando e monitorando essa contaminação na cadeia alimentar justamente para contribuir com a preservação”.
Grupo de Estudos
A pesquisa da professora Aurea Ignácio é supervisionada pelo professor, Olaf Malm, Laboratório de Radioisótopos, Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, UFRJ e conta com a parceria do professor Manoel dos Santos Filho, da Unemat e do professor Taal Levi da Oregon State University.
O projeto possui Licença do SISBIO, Número: 50387-1/2015, e conta com a parceria da equipe da Estação Ecológica de Taiamã: biólogo Daniel Kantec, médica veterinária Selma Samiko Miyazaki e o engenheiro florestal Thadeu Deluque Costa Pereira.Também colabora neste projeto o estudante de mestrado Manaav Kamath da Oregon State University (USA),
Artigos recentes do grupo:
– Cyanobacteriaenhancemethylmercuryproduction: A hypothesistested in theperiphytonoftwolakes in the Pantanal floodplain, Brazil (Lázaro et al., 2013).
Non-lethalsampling for mercuryevaluation in crocodilians (Lázaro et al., 2015).
– Mercury distribution in organsoffishspeciesandtheassociatedrisk in traditionalsubsistencevillagersofthe Pantanal wetland (Ceccato et al., 2015).
Fonte: Lygia Lima – UNEMAT