O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) derrubou a liminar que protegia da expansão urbana uma área de 65 quilômetros quadrados – equivalente a 9 mil campos do Maracanã – do Aquífero Guarani, em Ribeirão Preto (SP). A decisão suspende uma das maiores medidas já tomadas para preservação da segunda principal reserva hídrica subterrânea do mundo.
A suspensão da liminar é provisória, até que o mérito seja julgado, e ocorreu depois que a Prefeitura de Ribeirão entrou com recurso contra a proteção da área na zona leste da cidade. Ao G1, a administração municipal informou que se viu “obrigada” a pedir a revisão da liminar porque o Plano Diretor vigente permite a urbanização de parte dessa área.
No despacho, o relator da 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente, Paulo Alcides, afirmou que suspendeu a liminar concedida pela juíza Lucilene Canella Mello porque a decisão era contrária à lei.
“Aparentemente afronta as leis de zoneamento e parcelamento de solo urbano vigentes no Município de Ribeirão Preto, defiro a liminar para suspender, por ora, a decisão impugnada”, justificou o relator do TJ-SP.
Segundo a promotora do Meio Ambiente Cláudia Habib, uma das autoras da ação civil que motivou a liminar, a suspensão da medida é um risco para a região, que corresponde à zona rural de Ribeirão e é considerada fundamental para a recarga do reservatório.
“É uma situação muito séria, não temos dúvida de que se não deixarmos um percentual adequado para recarga o dano existente no aquífero se agravará cada vez mais”, disse.
“Quem mora em Ribeirão Preto não viveu ainda o que é não ter água, por conta do aquífero, mas ele não é eterno, é finito. E se não tomarmos providências agora será uma situação que não vamos conseguir reverter”, explicou a promotora.
A área já era visada pelas construtoras, interessadas no crescimento de bairros como o Jardim Helena e Recreio Internacional, que também foram, na liminar, impedidos de receber novos loteamentos em algumas partes.
O Ministério Público (MP) informou que já se manifestou contrário à decisão que suspende a liminar e o Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente (Gaema) aguarda que a Procuradoria do Estado entre com pedido de recurso na Justiça.
“Se é uma determinação judicial, era só ter acatado essa decisão, a Prefeitura não está fazendo nada de ilegal e não teve nenhum prejuízo”, disse a promotora. “Quem pode ser prejudicado é o particular, que quer explorar”.
Justificativa
Em nota enviada ao G1, a Prefeitura de Ribeirão Preto informou que se viu “obrigada” a entrar com o pedido de agravo. “O Plano Diretor vigente permite a urbanização de algumas áreas, e por isso, a Prefeitura foi obrigada a entrar com agravo”, disse.
Ainda segundo a nota, a administração municipal informou que não discorda da ação do MP que resultou na liminar de proteção. “A Secretaria de Planejamento Urbano está dialogando com o Ministério Público para que a preservação do meio ambiente seja mantida”.
A Prefeitura informou que a situação poderá ser resolvida com a aprovação da revisão do Plano Diretor. O documento que estabelece as diretrizes de crescimento urbano está inalterado desde 2003 e a revisão aguarda segunda apreciação da Câmara de Vereadores desde outubro do ano passado.
‘Cenário trágico’
O Aquífero Guarani possui 1,2 milhão de quilômetros quadrados de extensão e estende-se por sete estados do Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai.
Segundo o Gaema, o reservatório sofre rebaixamento de um metro de profundidade por ano e nas últimas décadas o nível hídrico da reserva caiu 72 metros e a situação é preocupante.
Na sentença que preservava a região, a juíza Lucilene Canella Mello, da 2ª Vara da Fazenda Pública de Ribeirão, considerou estudos técnicos e cita a observação feita por um engenheiro agrônomo que diz que “em cinco ou 10 anos não haverá mais água” no reservatório.
A liminar barrava os potenciais danos causados pela impermeabilização do solo em uma área considerada fundamental para a recarga do reservatório. Um dos pontos visíveis dessa situação é a Lagoa do Saibro, na zona leste de Ribeirão, que no ano passado teve a margem recuada devido à estiagem prolongada na cidade.
Fonte: Felipe Turioni – G1 Ribeirão e Franca