Antas estão morrendo e sendo afetadas por agrotóxicos utilizados no Cerrado de MS, aponta pesquisa

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Patrícia Medici (Foto: IPÊ)

O uso de pesticidas no Cerrado de Mato Grosso do Sul tem preocupado cientistas da fauna regional. De acordo com uma pesquisa publicada no final de junho, deste ano, na revista Wildlife Researchantas, antas brasileiras estão morrendo e sendo afetadas por agrotóxicos utilizados em propriedades agrícolas que ficam no bioma.

O documento assinado por cientistas da Iniciativa Nacional para a Conservação da Anta Brasileira, do Instituto de Pesquisas Ecológicas (INCAB-IPÊ), além de apontar a contaminação da espécie, pede investigações mais profundas sobre o tema, em decorrência do uso dos pesticidas irregulares.

A pesquisa conclusiva traz um relatório detalhado da detecção de pesticidas e metais pesados analisados nas antas. Uma das principais conclusões foi a detecção da alta prevalência do agrotóxico, popularmente conhecido como ‘chumbinho’, presente de forma intensa no conteúdo estomacal dos animais. De todas as antas avaliadas, 41% delas testaram positivo para este ou mais produtos químicos.

O estudo de campo foi feito entre os anos de 2015 e 2017, nas cidades de Nova Alvorada do Sul e Nova Andradina, municípios próximos a Campo Grande. Conforme os dados levantados pela pesquisa, esta região contém plantações de cana-de-açúcar, cultura que utiliza da pulverização aérea de inseticidas, agrotóxicos encontrados nos organismos das antas analisadas.

Em 2012, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento decidiram retirar do mercado brasileiro o agrotóxico aldicarbe, pesticida encontrado nos animais. Diante da presença dos pesticidas, após 2012, o estudo deixa claro que agricultores estão utilizando o produto irregular.

A coordenadora da INCAB e uma das autoras do artigo, Patrícia Medici, alerta para os riscos da contaminação das antas. “Esse é um estudo de longo prazo e conseguimos apontar agora com ampla certeza quais os agrotóxicos que estão afetando a saúde das antas. Embora pouco se saiba sobre o impacto da exposição crônica a estas substâncias ao longo de meses ou anos, já sabemos que o índice de pesticidas encontrado nos tecidos, outros órgãos e sangue dos animais é muito superior ao limite permitido de ingestão. Isso pode desencadear processos fisiológicos com implicações importantes para a saúde dos animais afetados, particularmente nas respostas endócrinas, neurológicas e reprodutivas”, afirma.

 

Agrotóxicos no habitat natural

Os especialistas explicam que as exposições das antas aos agrotóxicos são feitas no próprio habitat natural, seja pela ingestão de plantas em contato com o solo ou água contaminada. “A análise estomacal demonstra exposição pela ingestão de plantas nativas contaminadas e de itens das culturas agrícolas eventualmente utilizados como recurso alimentar”, descrevem.

“Isso é assustador e prejudicial e não sabemos ainda os efeitos colaterais para esses bichos. É como se as antas se alimentassem de veneno um pouco a cada dia, alimentando uma bomba-relógio em seu próprio corpo. Essa falta de conhecimento sobre a saúde da anta é um grande obstáculo para um planejamento adequado ações de conservação”, alerta Patrícia.
Além do “chumbinho”, outros pesticidas foram encontrados como organofosforados – diazinon, malathion e mevinphos também foram encontrados nas patas dos animais. A pesquisadora explica que as substâncias podem tornar as antas mais vulneráveis a infecções e doenças, afetando adversamente sua saúde e sobrevivência.

“Já está claro que a agricultura em grande escala no Cerrado brasileiro está resultando em pesticidas e exposição a metais em concentrações que excedem a segurança ambiental e pode causar efeitos adversos à saúde das antas e, talvez, de outros animais. Precisamos olhar com mais seriedade para essa questão que afeta os animais silvestres e as vidas humanas. É inadmissível a utilização de agrotóxicos sem critérios e sem fiscalização”, conclui Patrícia.

 

Foto de capa: Patrícia Médici com uma anta. Fonte: Tapir Conervation Initiative.

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