Por Luís Indriunas, do portal De olho nos Ruralistas: Observatório do Agronegócio no Brasil.
Em 2020, o Cerrado brasileiro perdeu 734.010 hectares de sua vegetação nativa, o que equivale a quase cinco vezes o tamanho da Grande São Paulo. O número representa um aumento de 13,7% em relação a 2019, quando foram desmatados 648.340 hectares, segundo o consórcio Chain Reaction Research. Desse total, 66,7% são dentro de propriedades privadas. As gigantes da soja, do gado e dos supermercados são as principais responsáveis por essa cadeia de comércio e devastação .
O estudo “Soja e carne por trás desmatamento do Cerrado em 2020” usa, como base, os alertas de desmatamento emitidos pelo Sistema de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Prodes/Inpe), cruzando-os com imagens de satélite para confirmação das supressões vegetais e rastreando as cadeias de suprimentos de commodities para determinar quem está por trás do desmatamento.
Parte dos casos monitorados é oriundo dos relatórios mensais Rapid Response, desenvolvidos pelas organizações Aidenvironment e Mighty Earth, com a participação do De Olho nos Ruralistas na pesquisa sobre cadeia dominial. A partir de hoje, o observatório publica alguns destes casos em português: “De Olho nos Ruralistas publica relatórios sobre desmatamento na Amazônia e no Cerrado“.
Soja responde por 28,3% da devastação
A soja foi o principal produto a devastar o Cerrado em 2020, com 207.813 hectares, equivalentes a 28,3% da área total desmatada. Mais da metade dessa destruição é oriunda de fazendas administradas por grandes produtores de soja: SLC Agricola, Nuveen e JJF Holdings, entre outras, retiraram 110.333 hectares de vegetação nativa. A campeã SLC tirou do bioma 10.152 hectares.
Na cadeia comercial, esses conglomerados sojeiros vendem para transnacionais como as estadunidenses Cargill, Bunge e Archer-Daniels-Midland (ADM), a francesa Louis Dreyfus Company (LDC) e a chinesa Cofco. Nessa relação entre comércio e desmatamento, a Chain Reaction coloca a Bunge como a principal compradora de áreas desmatadas no Cerrado, com 27.208 hectares destruídos pelos seus principais fornecedores em 2020. Além disso, os silos da Bunge estão próximos de outros 64.283 hectares desmatados.
Os grandes frigoríficos também são apontados como importantes contribuintes para o desmatamento no Cerrado. JBS, Marfrig e Minerva são as quem têm maior exposição à devastação. A empresa dos irmãos Wesley e Joesley Batista comprou bois de fazendas responsáveis por 1.984 hectares desmatados na região em 2020.
Essa carne abastece algumas das principais redes varejistas do Brasil: Grupo Casino, Carrefour e Cencosud estão ligadas a 2.189 hectares devastados no Cerrado. A campeã foi a Casino, companhia de capital francês responsável pelas redes Pão de Açúcar e Extra, que teve influência sobre 1.237 hectares devastados.
Sobreposições representam 68% do desmate em terras públicas
Dentre os casos de desmatamento monitorados pela Chain Reaction em 2020, 19,2% se deram em áreas públicas. Ao todo, foram desmatados 141.186 hectares em assentamentos rurais, terras indígenas, unidades de conservação e reservas federais e estaduais.
A pesquisa aponta que 68,4% desse total apresentam sobreposição de posse de terra. Ou seja, 96.608 hectares desmatados em terras públicas estão registrados por organizações privadas. Em outras palavras, grilagem. Outros 103.212 hectares (14%) estão em terras sem designação legal.
Entre as recomendações, o relatório aponta para a necessidade de resolver incertezas fundiárias e combater a grilagem para diminuir as taxas de desmatamento nessas áreas. Entre as consequências dessa destruição, envolvendo principalmente a soja, o documento lista a perda de biodiversidade, aumento nas emissões de CO2 e danos às bacias hidrográficas.
| Luís Indriunas integra a equipe de editores do De Olho nos Ruralistas. |