*Texto originalmente publicado em 12 de março de 2008.
O extrativismo sustentável, hoje difundido com sucesso em vários assentamentos, aldeias e propriedades de agricultura familiar, começou de uma experiência pioneira da organização não-governamental Ecoa e o assentamento Andalucia, no município de Nioaque, em Mato Grosso do Sul. A partir de 2001, a ONG forneceu cursos de capacitação, nos quais os moradores puderam aprender sobre cultivo, beneficiamento de espécies nativas como o baru (ou cumbaru) e oficinas de tecelagem e tapeçaria.
As oficinas resultaram na inauguração do Centro de Produção, Pesquisa e Capacitação do Cerrado (Ceppec), em dezembro de 2003, com a finalidade de capacitar, pesquisar e tornar-se um centro de referência para os trabalhadores rurais do Cerrado / Pantanal. Além de ser um elo entre os pequenos projetos e grupos rurais. Em Março de 2005, o Ceppec passou a ser reconhecido como uma organização não-governamental e desde então são realizados cursos, pesquisa e a comercialização dos produtos gerados pelo Centro.
“O Ceppec é a consolidação de um sonho coletivo de agricultores familiares que vivem no assentamento Andalucia, no município de Nioaque, numa região de Cerrado em Mato Grosso do Sul. Foi em 1998, a partir dos conhecimentos locais e de novas ideias trazidas por oficinas da ONG Ecoa, que algumas famílias discutiram como diversificar a renda sem prejudicar o Cerrado. Com a consolidação das atividades, o grupo adquiriu autonomia e se organizou para fundar o Ceppec”, ressalta Alcides Faria, diretor executivo da Ecoa.
Repassando conhecimento
Todos os conhecimentos adquiridos com o passar dos anos, agora são difundidos nas aldeias e assentamentos de várias cidades do estado, como pôde ser presenciado no “Programa de Fomento a Projetos de Assistência Técnica e Extensão Rural para Agriculturas(es) Familiares no Território da Reforma (MS)”. O programa beneficiou 400 pessoas de 50 assentamentos e aldeias indígenas de Mato Grosso do Sul, com apoio do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Ceppec e da ONG A Casa Verde, também pioneira no extrativismo sustentável.
De 12 a 14 de março, no município de Nioaque, acontece o Seminário Final para Elaboração Participativa do Plano de Continuidade do programa. Nioaque, Guia Lopes da Laguna, Anastácio, Jardim, Bonito, Bodoquena, Sidrolândia, Dois Irmãos do Buriti, Bela Vista, Terenos e Maracaju são os 11 municípios que integram, segundo o Programa Nacional de Territórios Rurais (Governo Federal), a região denominada de Território da Reforma Agrária, área foco das ações.
O Programa acontece desde maio de 2007 e obteve como principais resultados a implementação de um corredor de extrativismo, elaboração de produtos de comunicação (catálogo, site, logomarca, programa de rádio, boletins impressos, folder, banner), diversificação na produção rural, implementação de boas práticas de manejo extrativista, recuperação de áreas degradadas e ações contra a desertificação no Cerrado.
Segundo a coordenadora do programa, Rosane Bastos, quatro espécies nativas do Cerrado estão sendo trabalhadas na linha de produção de alimentos do Cerrado: o cumbaru ou baru (chamado de castanha-do-cerrado), o pequi, a bocaiuva e o jatobá. “O uso desses frutos na alimentação e comercialização, por exemplo, em Nioaque e Campo Grande e Anastácio, são uma conquista do programa”, afirma Rosane Bastos.
O próximo passo dos assentamentos é levantar o potencial dos frutos no Território da Reforma Agrária com potencial de mercado e implementar um plano de negócios, que prevê a produção e comercialização de espécies do Cerrado abundantes na região, ricas em nutrientes e vitaminas, sem desmatamentos ou degradação ambiental. Os assentamentos Andalucia e Monjolinho, por exemplo, já comercializam produtos como farinhas, castanhas e artesanatos em feiras da economia solidária.
Ao mesmo tempo em que os assentamentos e aldeias indígenas do programa melhoram a segurança alimentar, diversificam a produção e ainda ganham renda com o Cerrado, também contribuem com a conservação de uma grande riqueza de biodiversidade presente no bioma e que se perde a cada desmatamento. Somente nos 11 municípios que integram o projeto da A Casa Verde e Ceppec existem cerca de 30 espécies (recursos não-madeireiros) medicinais, alimentícias e úteis ao artesanato. “Estamos fornecendo assistência técnica com olhar diferenciado em relação aos recursos naturais”, revela a coordenadora Rosane Bastos.
Com investimentos de cerca de R$ 150 mil da Secretaria da Agricultura Familiar (SAF) / Ministério do Desenvolvimento Agrário, o “Programa de Fomento a Projetos de Assistência Técnica e Extensão Rural para Agriculturas(es) Familiares no Território da Reforma (MS)” tem parcerias com a Rede Cerrado de Ongs, Centro de Apoio Sócio-Ambiental (Casa), UFMS, Instituto HSBC Solidariedade, ISPN (Instituto Sociedade, População e Natureza), Prefeitura Municipal de Nioaque e associações dos assentamentos e aldeias indígenas beneficiados.