Por Josilene Rocha, Observatório do Terceiro Setor.
Comunidades tradicionais do Pantanal brasileiro estão habituadas a lidar com muitos desafios. A distância das grandes cidades, o esquecimento do poder público e a imprevisibilidade típica do próprio bioma são alguns deles. Mas 2020 foi um ano mais desafiador do que a maioria, com a pior seca em 50 anos e queimadas que devastaram 30% do Pantanal.
Diante deste cenário, algumas comunidades, como a da Barra do São Lourenço, em Mato Grosso do Sul, viram o nível do rio baixar, as suas águas ficarem barrentas e cheias de cinzas e os peixes desaparecerem.
O rio Paraguai era nesta comunidade a única fonte de água potável. Era com a água do rio que a comunidade cozinhava. Era a água do rio que a comunidade bebia.
E, neste momento crítico, a resposta do poder público não chegou. “As respostas para o ser humano foram muito morosas”, afirma André Luiz Siqueira, diretor-presidente da Ecoa, uma organização sem fins lucrativos que atua há mais de 30 anos no Pantanal. A ONG foi a responsável por buscar soluções para garantir que as 25 famílias da comunidade da Barra do São Lourenço não ficassem sem água potável.
A primeira ação foi de caráter emergencial. A doutora Silvia Santana arrecadou galões de água mineral e a Ecoa os levou até a comunidade.
A situação, no entanto, mostrou que era preciso pensar em uma solução sustentável, que evitasse novas emergências como aquela. Até porque 2021 deve ser mais um ano de seca severa na região, e o problema da falta de água já era antigo na comunidade.
A escassez de água potável afetava principalmente a saúde das crianças. “As crianças sofriam muito de diarreia na comunidade. E a diarreia em crianças recém-nascidas ou pequenas afeta diretamente no desenvolvimento cerebral”, explica o diretor-presidente da Ecoa.
Mini-usina de tratamento de água
A solução sustentável encontrada foi instalar uma mini-usina para tratamento de água na comunidade. A estação é movida a energia solar e tem capacidade para tratar 2 mil litros de água por dia.
Para instalá-la, a Ecoa contou com doações de indivíduos e, principalmente, com uma doação do Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT/MS).
A manutenção ficou a cargo de lideranças da própria comunidade. “A gente já tem vários equipamentos públicos na Barra do São Lourenço, inclusive uma usina fotovoltaica que atende a escola pública da comunidade. E nós trabalhamos sempre com a metodologia de capacitar lideranças para cuidarem desses equipamentos”, conta André Siqueira.
O diretor-presidente da Ecoa também conta que uma idosa, moradora da comunidade há pouco mais de três décadas, ficou até emocionada quando tomou pela primeira vez a água da mini-usina. “Em 33 anos, eu nunca tomei uma água assim”, disse a idosa, que fez questão de brindar com a água limpa e fresca.
Fome no Pantanal
Devido à seca e à contaminação da água pelas cinzas das queimadas, moradores de algumas comunidades do Pantanal brasileiro têm sofrido com a falta de peixes, que eles pescavam para o próprio consumo e para a venda.
O extrativismo vegetal também ficou comprometido em algumas regiões, já que as queimadas destruíram milhares de hectares. “A severidade climática e as queimadas estão fazendo as pessoas passarem fome”, relata Siqueira.
Mais uma vez, o trabalho da Ecoa tem suprido lacunas deixadas pelo poder público. De setembro para cá, já foram entregues 213 cestas básicas para as comunidades de Barra do São Lourenço, Paraguai-Mirim e São Francisco (as três localizadas na Serra do Amolar, no distrito de Corumbá, MS) e para pescadores de Miranda e Anastácio, municípios também do Mato Grosso do Sul.
Além disso, desde que começou o trabalho no Pantanal, a ONG tem promovido pesquisas e projetos com foco no desenvolvimento sustentável da região, por acreditar que é importante proteger a biodiversidade e garantir melhor qualidade de vida para as comunidades tradicionais.