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Morte em massa de abelhas: a relação entre agrotóxicos e a morte dos polinizadores

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Espirais com abelhas mortas. Divulgação: Sarah Hatton

Com informações da Folha de São Paulo.

  • Só no Mato Grosso foram 100 milhões de mortes em 2023.
  • As mortes de abelhas no país têm em comum o uso inadequado do fipronil.
  • Mais de 70% de todos alimentos que consumimos dependem da polinização das abelhas

Em 2023, o Brasil já registrou a morte de milhões de abelhas. Em Mato Grosso, no mês de julho, foram cerca de 100 milhões e em junho, na Bahia, 80 milhões. E o que os casos têm em comum? O fipronil, agrotóxico banido na União Européia, mas ainda permitido e usado no Brasil.

O uso do produto é autorizado pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), porém, por ser tóxico para abelhas, não é permitido o uso de aviões para pulverização e, segundo investigação realizada pelo Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso (Indea), foi o que aconteceu.

De acordo com um levantamento da Folha, a substância também foi responsável pela morte de 50 milhões de abelhas em Santa Catarina, em 2017, e pelo surto que dizimou quase 500 milhões no Rio Grande do Sul, entre outubro de 2018 e março de 2019.

O fipronil atua no sistema nervoso central dos insetos e é como agente da morte aguda. Além disso, a abelha infectada leva o veneno para a colmeia e contamina o enxame.

Em entrevista à Folha, o apicultor José Arnildo Marquezin, afirmou que não há lugar mais arriscado para uma abelha hoje do que ao lado de uma fazenda. “Você nunca sabe que agrotóxicos vão usar, e como vão usar”.

A médica veterinária Erika do Nascimento, fiscal do Indea, analisou a situação ocorrida no Mato Grosso. “Não consideraram a temperatura e o vento recomendados para a aplicação e, naquele dia, ainda ocorreu inversão térmica, potencializando o efeito nocivo por um raio de 26 km [quilômetros]”.

A fiscalização no estado percorreu 22 propriedades e encontrou a substância em uma fazenda de algodão, com multa de R$ 225 mil para o produtor. Na Bahia, os culpados não foram localizados.

Um amplo estudo de revisão feito por um grupo internacional de pesquisadores, entre eles a bióloga Vera Lúcia Imperatriz-Fonseca, do Departamento de Ecologia do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP), concluiu que o uso intensivo de fertilizantes químicos, a destruição e degradação de áreas florestais e o agravamento das mudanças climáticas são as causas do declínio das populações de insetos polinizadores, como abelhas, moscas e borboletas, ao redor do mundo.

Em artigo publicado na revista Nature, a equipe apresenta as principais ameaças associadas à diminuição de espécies polinizadoras em várias regiões do planeta tendo como base dados biológicos e registros da lista vermelha das espécies ameaçadas da União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais (IUCN).

No estudo, os pesquisadores verificaram que as cerca de 20 mil espécies de abelhas conhecidas polinizam mais de 90% das 107 principais culturas do mundo. Não por acaso, 75% da alimentação humana depende direta ou indiretamente da ação de animais polinizadores.

A correlação entre fipronil e mortes agudas dos polinizadores precisou de tempo investido nas pesquisas. À Folha de São Paulo o professor aposentado da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), Aroni Sattle, explicou que no início das investigações ele não encontrava nenhuma doença ou praga que justificasse a mortandade.

Em 2018, o professor enviou 37 amostras congeladas para avaliação e o fipronil apareceu como agrotóxico preponderante. “Podemos afirmar que 60% a 70% das mortandades são provocadas por ele”.

Segundo o Ibama, os órgãos de defesa agropecuária estaduais já tomaram providências, “uma vez que se trata de mortandade de abelhas manejadas principalmente para produção de mel”.

Talita Oliveira

Jornalista do Núcleo de Comunicação da Ecoa.

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