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Paraná, a crise da água e mais represas – tudo junto e misturado

6 minutos de leitura

– Em um dia, decreto de “emergência hídrica” por 180 dias, no outro, 15 represas aprovadas.

– Curitiba, a capital, e cataratas do Iguaçu sem água, mas deputados aprovam 15 represas para geração elétrica.

– Em 2017, um instituto afirma que o estado “encontra-se em situação excelente com relação ao balanço hídrico”.

Por Alcides Faria

No dia 7 de maio de 2020, o governador do estado do Paraná (PR) decretou “emergência hídrica” por 180 dias [1] e, no dia 19, o presidente da Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar), Claudio Stabile, disse na Assembleia Legislativa que indicadores na Região Metropolitana de Curitiba mostravam situação somente vista no século 19. No dia 6 de maio, portanto, no dia anterior ao decreto de emergência hídrica, a Assembleia Legislativa do estado aprovou proposta de construção de 15 represas para geração elétrica nas bacias dos rios Iguaçu, Paraná e Piquiri. O projeto de lei foi enviado pelo governador, recebeu 35 votos a favor e sete contrários, com quatro abstenções. O parecer da Comissão de Meio Ambiente foi contrário.

O tamanho da crise em sua parte mais visível nacional e internacionalmente talvez tenha sido o quadro do rio Iguaçu, o qual tem seu curso quase todo no território paranaense: as Cataratas sem água e reservatórios das principais represas nos níveis mais baixos dentre os sistemas de geração hidráulica [2] do País, uma marca clara do quadro de crise existente à época. Em maio de 2020, registrou o nível mais baixo desde 1931 [3].

A não consideração adequada das mudanças ambientais em direção às crises leva a conclusões duvidosas como a do Instituto Paranaense do Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes), em 2017. A instituição concluiu que “o Paraná possui uma disponibilidade hídrica superficial total da ordem de 1.153.170 l/s, sem considerar a contribuição dos rios Paraná e Paranapanema. Dessa forma, encontra-se em situação excelente com relação ao balanço hídrico. A relação entre a disponibilidade e a demanda hídrica superficial mostra que apenas 3,4% da água superficial do Estado é utilizada”. Tal registro está no estudo “Indicadores de Desenvolvimento Sustentável por Bacias Hidrográficas do Estado do Paraná” [4]. É certo que estudos como o do Ipardes estejam na base de políticas públicas para a geração de energia. 

O estado do Paraná tem a maior parte de seu território na bacia do rio Paraná e, por isso, vale registrar que eventos climáticos extremos, com graves consequências sociais e econômicas ocorreram na sub-bacia do rio Paraná nos últimos anos.

Parte da bacia do rio Paraná – à esquerda está o estado do Paraná (Imagem NASA)

Talvez o que mais danos tenha causado foi a falta de água que atingiu duramente o estado de São Paulo, o mais populoso e industrializado [5] do País, a partir de 2014. Nesse ano, o problema se apresentou, com o nível da água do rio Tietê, um tributário do Paraná, muito baixo, o que levou menor produção de energia elétrica e prejudicou o transporte de cargas pela hidrovia Tietê-Paraná, o qual foi depois interrompido por mais de 2 anos, entre abril de 2015 e janeiro de 2016. Milhares de caminhões foram utilizados para substituir as barcaças paradas. Milhões de pessoas da capital, São Paulo, foram submetidas a racionamento – o Instituto Datafolha pesquisou e encontrou que o racionamento atingiu de “forma dura ao menos 35% dos paulistanos, em especial os mais pobres e com baixa escolaridade” – e a indústria teve sérios problemas para operar. 

Notas

[1] É a pior situação desde que o Sistema de Tecnologia e Monitoramento Ambiental do Paraná (Simepar) começou a monitorar as condições do tempo, em 1997.

[2] Representa 10,1% da capacidade instalada de geração hidrelétrica no País (Agência Nacional de Água)

[3] Copel e o Simepar.

[4] Revista de indicadores de Desenvolvimento Sustentável por bacias hidrográficas do estado do Paraná

[5] São Paulo tem cerca de 44 milhões de habitantes e o PIB atingiu em 2019 R$ 2,38 trilhões, segundo a Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade).

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