Há mais de 10 anos, 22 famílias tradicionais que moram no encontro dos rios Paraguai e São Lourenço no Pantanal, esperavam a visita do poder público. A região chamada de comunidade da Barra do São Lourenço foi palco de intensas disputas territoriais, com expulsões e severas restrições de uso para as famílias. Muitas das pessoas que viviam na área foram embora. Mas agora, há uma nova esperança que as coisas possam mudar.
Após anos de discussão entre poder público, sociedade civil organizada e empresas de turismo, acompanhado de estudos científicos, há uma proposta concreta de dar direito de território às famílias que vivem na Barra do São Lourenço. Ao longo desses anos, muitos dos mitos já foram desconstruídos. Por exemplo, ao contrário do que se pregava, hoje é sabido que o uso que eles fazem do recurso celebra a sustentabilidade na região. A ideia é que se crie uma Unidade de Conservação na categoria de Reserva de Desenvolvimento Sustentável. Esse tipo de área protegida permite o uso de recursos naturais, a celebração do turismo, a proteção da biodiversidade e, ao mesmo tempo, dá direito de uso do território para as comunidades locais sem a necessidade de desapropriação de áreas privadas. Em outras palavras, é um mecanismo legal de promoção da sustentabilidade.
Para dar encaminhamento a essa proposta, no mês de agosto, visitaram a região, o Diretor de Criação e Manejo de Unidades de conservação (UCs) do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Ricardo Brochado Alves da Silva, e Bernardo de Brito, Coordenador Geral de Criação, Planejamento e Avaliação de Unidades de Conservação (ICMBio), acompanhado por Nuno Rodrigues, chefe do Parque Nacional (PARNA) do Pantanal Matogrossense.
O momento considerado histórico, também acompanhado por André Luiz Siqueira, diretor presidente da Ecoa, é resultado de anos de trabalho junto aos órgãos ordenadores de direito que, conforme ressalta André, “foram determinantes para quebra da invisibilidade e marginalização da comunidade como SPU [Secretaria de Patrimônio da União/MS], MPF [Ministério Público Federal/MS], MPT [Ministério Público do Trabalho/MS], Justiça Federal, além das instituições de pesquisa como UFMS [Universidade Federal de Mato Grosso do Sul], Campus Pantanal, e Embrapa Pantanal. Durante esses 10 anos de discussões para segurança jurídica e territorial foram inúmeros os parceiros determinantes para o reconhecimento que hoje existe”.
Segundo André, “o reconhecimento assegura que situações como sobreposição de territórios tradicionais e expulsões não se repitam. A proposta de criação da RDS segue de forma transparente e em diálogo com todos os setores. Se criada, pode contribuir na resolução de longos anos de conflitos”.
De acordo com Ricardo Brochado, o processo para criação de uma RDS é longo, mas o ICMBio tem o compromisso de conversar com os diversos segmentos para que se crie uma UC que possa reduzir os conflitos existentes e evitar conflitos futuros.
Previamente a visita na comunidade, a Ecoa promoveu uma reunião em Corumbá no dia 23 de agosto – uma das ações do Projeto ECCOS (Ecorregiões, Conectadas, Conservadas, Sustentáveis) que tem apoio da União Europeia – , na qual compareceram membros da Barra do São Lourenço, representantes da sociedade civil, do setor de turismo e de órgãos governamentais para tratar dos temas supracitados.
Para que o processo caminhe é importante a participação da sociedade. Apenas com o apoio de todos poderemos proteger o Pantanal e ao mesmo celebrar o desenvolvimento daqueles que vem protegendo o Pantanal há mais de 200 anos.