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Nove meses após tragédia, lama ainda é ameaça em Mariana

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Folha Uol

 

Com quatro meses de vida, a barragem de Fundão, centro da tragédia de Mariana (MG), em novembro de 2015, já tinha sofrido uma erosão interna. Nos sete anos em que represou lama, ela ganhou tantos remendos que mais parecia uma colcha de retalhos.

Para a investigação, uma série de decisões mal tomadas pela mineradora Samarco, controlada pela Vale e pela BHP Billiton, levou ao desastre com 19 mortos e um tsunami de rejeitos de minério que poluiu o Rio Doce até o litoral do Espírito Santo.

Nove meses depois, nenhum responsável pela tragédia foi punido —funcionários foram indiciados pela PF, mas ainda cabe ao Ministério Público Federal decidir sobre a denúncia judicial. Para recuperar as áreas, foi costurado um acordo, por enquanto suspenso pela Justiça.

A lama que sobrou ainda é uma ameaça, pois pode vazar com as chuvas. Para tentar contê-la, a Samarco tem feito obras –consideradas insuficientes pelo Ibama.

OBRA PROBLEMÁTICA

Fundão apresentou falhas desde o início da operação, em 2008. Em seu quarto mês, uma erosão interna forçou seu esvaziamento emergencial. Nos anos seguintes, houve infiltrações, drenos entupidos e obras mal-executadas.

Para a PF, a Samarco usou material mais barato na drenagem para economizar. Apesar disso, o reservatório não parava de crescer (13 metros/ano) para suportar a alta de produção da empresa.

A Samarco diz que repudia “especulação sobre conhecimento prévio” de risco de ruptura e que sempre teve altos padrões de segurança.

RECUO DO EIXO

O pivô da tragédia, para a investigação, é uma obra iniciada em 2012 que deixou o topo da barragem em forma de “S”. Não recomendada por engenheiros, a alteração foi feita sem projeto, mas registrada em documentos enviados ao governo de Minas.

O recuo foi feito para que houvesse uma drenagem na lateral em Fundão. A Samarco diz que ele era temporário e fazia parte da operação da barragem —por isso não havia necessidade de projeto.

TRINCAS E MANUTENÇÃO

Em vistoria em setembro de 2014, o projetista de Fundão disse ter visto trincas no “S” do recuo. Em depoimento, afirmou que a situação era “severa” e precisava de “providência maior do que a que a Samarco estava tomando”.

Nos dez dias que antecederam a ruptura, a mineradora deixou de medir os aparelhos que controlavam a pressão da água no solo. Nos dois dias anteriores, os equipamentos foram desligados para manutenção. A Samarco diz que considerou todas as recomendações e tomou providências.

DANOS

A lama afetou a pesca no Rio Doce. Para evitar mais poluição, a Samarco construiu diques, mas eles não vão impedir que os rejeitos cheguem aos rios em época de chuva, de acordo com o Ibama.

A mineradora diz que, para evitar vazamentos, precisa construir novo dique em distrito de Mariana —mas é alvo de resistência de famílias e Promotoria, que temem os impactos. Em relação às vítimas, familiares dos 19 mortos já receberam indenização. Um corpo ainda não foi achado.

ACORDO

Um acordo da Samarco com a União e os governos de MG e ES foi assinado em março, com previsão de gasto de R$ 4,4 bilhões até 2018 para a recuperação do Rio Doce.

A homologação ocorreu em maio, mas foi suspensa pelo Superior Tribunal de Justiça, devido à falta de debate com Ministério Público e as populações atingidas. Empresas e governos recorreram, mas ele foi anulado nesta semana e voltará a ser discutido. A Procuradoria pede na Justiça reparação de R$ 155 bilhões.

RESPONSÁVEIS

Seis funcionários da Samarco, um da Vale e um da VogBR (que prestava serviços à mineradora), além das três empresas, foram indiciados pela PF sob suspeita de crime ambiental. Também foram denunciados pelo Ministério Público Estadual de Minas Gerais, sob acusação de fraude no processo de licenciamento, oito funcionários da Samarco e dois da VogBR. Todos negam irregularidades.

Ninguém foi punido, e o Ministério Público Federal ainda não apresentou denúncia. Diretores e gerentes da Samarco, incluindo o ex-presidente Ricardo Vescovi, deixaram o cargo para se defender.

VALE

Em 2010, a Samarco autorizou a Vale a jogar lama em Fundão. Nem o governo de Minas nem o DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), da União, tinham sido informados disso.

Um mês após a tragédia, a Vale modificou dados oficiais de produção. Para a Polícia Federal, foi uma tentativa de mostrar que jogava menos rejeitos no local, para diminuir sua responsabilidade.

A mineradora diz ter corrigido 1% dos dados dos relatórios, como é admitido pela legislação, com acompanhamento das autoridades e que agiu com transparência.

 

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