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Abelhas sem ferrão podem elevar cultivo em até 18% sem desmatamento

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Abelhas são responsáveis por mais de 80% da polinização de flores e frutos em toda a natureza — Foto: Érico Andrade/g1

Por Isabella Mengelle, G1 Ribeirão Preto e Franca

Pesquisas indicam que a meliponicultura, como é chamada a técnica que usa polinização feita por abelhas sem ferrão na produção, pode aumentar em até 30% a produção agrícola. No caso do café, o aumento constatado já atingiu a marca de 18%, segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

“Com as abelhas, a gente consegue aumentar a produção sem a necessidade de expandir a área de plantação. Isso acontece porque nós fazemos um direcionamento das abelhas durante a florada. Influencia na qualidade da produção e na proteção dos biomas nativos”, afirma Guilherme Campanha, pesquisador da instituição.

A conscientização de produtores a respeito dos benefícios das abelhas para o agronegócio foi um dos objetivos da Embrapa durante a Agrishow, feira de tecnologia e inovação para o setor, em Ribeirão Preto (SP).

Segundo Campanha, apesar dos resultados promissores, ainda são poucas as plantações com a polinização de abelhas sem ferrão.

“Mesmo sabendo que as abelhas beneficiam mais de 30 cultivos agrícolas, no Brasil, a gente só tem duas produções em que a integração entre abelha e agro está realmente consolidada: o melão no Nordeste e a maçã no Rio Grande do Sul. São frutos que se beneficiam demais com as abelhas.”

Os insetos são responsáveis por mais de 80% de toda a polinização que acontece na natureza, permitindo que diversas espécies sejam fecundadas e produzam sementes e frutos. Quando a polinização acontece, não só a quantidade aumenta, mas a qualidade dos produtos também.

O processo aumenta a quantidade de açúcar nas frutas, influenciando no sabor, e aumenta o tamanho do fruto e a quantidade de sementes produzidas.

Abelhas sem ferrão influenciam produtividade de lavouras — Foto: Érico Andrade/g1
Abelhas sem ferrão influenciam produtividade de lavouras — Foto: Érico Andrade/g1

Uso de abelhas em diferentes culturas

O pesquisador Guilherme Campanha explica que o Brasil é o país que tem a maior diversidade de abelhas em todo o mundo.

“Elas ficam em toda a região tropical e subtropical do globo, mas só no Brasil já temos 244 espécies catalogadas.”

Em Ribeirão Preto, o uso das abelhas jataí vem crescendo nos últimos tempos. É o que conta Pedro Moyses, que constrói criadouros para a criação racional de abelhas em casas e apartamentos na cidade.

“As jataís e as mirins, que são abelhas menores e mais dóceis, vêm sendo bastante solicitadas ultimamente e muito direcionadas para a produção de morango.”

Exposição de produtores de mel — Foto: Érico Andrade/G1
Exposição de produtores de mel — Foto: Érico Andrade/G1

De acordo com o pesquisador Guilherme Campanha, o uso das jataís para a polinização do morango influencia não só no sabor e no tamanho, mas na durabilidade da fruta. “A gente tem pesquisas que mostram que o morango bem polinizado pode ganhar até 12 horas a mais de prateleira do que o não-polinizado.”

Espécies diferentes performam de maneira diferente em cada tipo de planta. Segundo Pedro Moyses, outra variedade que também vem demonstrando resultados positivos com a polinização natural direcionada para as lavouras é o maracujá.

“As abelhas têm diferentes tamanhos, agilidade, tipo de voo, então cada uma vai bem em uma espécie diferente de planta. O maracujá, por exemplo, recebe várias espécies de abelha na floração, mas quem faz a polinização é a mamangava, por conta do tamanho. Por ser uma abelha grande, ela consegue passar na parte masculina e feminina da planta para fazer a fecundação”, diz.

As mamangavas são abelhas solitárias de grande porte muito resistentes e importantes para a polinização — Foto: Wilton Felipe/Acervo Pessoal
As mamangavas são abelhas solitárias de grande porte muito resistentes e importantes para a polinização — Foto: Wilton Felipe/Acervo Pessoal

Outra cultura que vem aderindo ao uso dos criadouros de abelhas sem ferrão cada vez mais é o café.

“As mandaguaris também vêm sendo bastante direcionadas para plantações de café e são muito eficazes na polinização dessa cultura. Têm dado um resultado bem legal, os cafeicultores estão gostando bastante do resultado”, diz Moyses.

Segundo Guilherme, os principais pontos que chamam a atenção são a melhora na qualidade dos grãos e na uniformidade do café.

Abelhas são insetos que ajudam no equilíbrio da natureza — Foto: Érico Andrade/G1
Abelhas são insetos que ajudam no equilíbrio da natureza — Foto: Érico Andrade/G1

Diferença no mel também impacta no agro

Além do impacto das abelhas nas plantações, a existência das abelhas sem ferrão também é importante para o mercado de mel.

Para o pesquisador Guilherme Campanha, a procura pelo mel de abelhas sem ferrão é grande, principalmente por conta da diversidade de gostos e texturas produzida pelas abelhas.

Isso acontece, segundo Moyses, porque a forma de produzir mel dessas abelhas é diferente do mel da abelha com ferrão.

“A principal diferença entre o mel da abelha sem ferrão e da africana é a fermentação. O mel da abelha sem ferrão tem uma concentração de água bem maior, e isso faz com que os micro-organismos que vivem em simbiose com a colônia encontram melhores condições de proliferação, tornando a fermentação melhor. Isso faz com que o sabor do mel delas fique diferente”, diz.

Além disso, a forma de estocar o mel também é um fator de relevância.

“As abelhas sem ferrão estocam o mel em cerumes, que são potes de mel feitos por resinas de plantas, cera da abelha mesmo. Conforme o mel fica ali dentro, ele vai absorvendo características da colônia de cada espécie. Além da variação de sabor decorrente das floradas, tem também a variação decorrente da espécie da abelha,” explica.

Forma de produção de mel das abelhas sem ferrão garante mais variedade de sabores e texturas, diz pesquisador da Embrapa — Foto: Érico Andrade/g1
Forma de produção de mel das abelhas sem ferrão garante mais variedade de sabores e texturas, diz pesquisador da Embrapa — Foto: Érico Andrade/g1

Uso de indiscriminado de agrotóxicos é ameaça

Apesar do crescimento da conscientização sobre a importância de abelhas para incrementar as lavouras, a existência das colônias vem sendo ameaçada por diversos fatores. Entre eles, destaca-se o uso indiscriminado de agrotóxicos agrícolas e o desequilíbrio ambiental causado pelo desmatamento.

Para o biólogo Fernando Quenze, pesquisador da área de defensivos agrícolas na Embrapa, o grande problema está no uso que os próprios produtores fazem dos agrotóxicos.

“A maioria dos casos de mortalidade de abelhas está associado ao mau uso, ao agricultor que faz misturas desconhecidas no tanque ou usa com dosagem acima do permitido por testes. Essa liberação alta de agrotóxicos é de produtos que já estavam sendo usados, mas quebraram as patentes e novas empresas começaram a produzir suas próprias versões.”

Uso indiscriminado de agrotóxicos afeta polinizadores e pode prejudicar lavouras vizinhas — Foto: Getty Images
Uso indiscriminado de agrotóxicos afeta polinizadores e pode prejudicar lavouras vizinhas — Foto: Getty Images

 

O problema se desenrola em cascata quando o olhar se volta para a falta de abelhas no meio ambiente.

“As abelhas muitas vezes estão na mata, mas a área de cultivo está em volta. A aplicação pode chegar de forma direta ou indireta. De forma direta, a abelha está na flor e o produto é pulverizado diretamente nela, ou indireta, quando a pulverização é mal feita e o vento acaba levando para a mata próxima à plantação. Mais de 90% das plantas nativas das florestas dependem das abelhas para polinizar a manter o fluxo de renovação das matas,” explica Fernando.

A solução para o problema, segundo o biólogo, depende de comunicação entre os criadores de abelhas e os produtores rurais.

“O produtor avisa quando vai fazer pulverização e o criador faz o manejo correto para proteger as abelhas. Nesse caso, a relação é extremamente positiva e já vem mostrando que dá certo. A mortalidade das abelhas cai e a produtividade do agricultor aumenta,” afirma.

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