– Teria o Banco considerado as sucessivas crises climáticas que afetam a região?
– A J&F assumiu o acordo para construção de barcaças feito pela Vale com a HBSA em 2012?
– Em 31 dos últimos 60 meses, o rio Paraguai não teve as condições ideais para navegação.
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aprovou financiamento de R$ 3,7 bilhões para a construção de 400 barcaças e 15 empurradores para a Hidrovia Paraná Paraguai, via que no Brasil atravessa o Pantanal, de Cáceres, no MT, até Porto Murtinho no MS. A justificativa é que os equipamentos serão destinados para o transporte de minérios de ferro e manganês pelos rios Paraná e Paraguai.
A empresa a recebedora dos recursos – com origem no Fundo da Marinha Mercante (FMM) – é a LHG Logística, do grupo J&F, o mesmo que adquiriu em abril de 2024 as minas de ferro e manganês da Vale em Corumbá (MS), por R$ 1 bilhão.
Quanto ao empréstimo a agência de notícias do BNDES publicou que as embarcações serão construídas em seis estaleiros nacionais e entregues ao longo dos próximos quatro anos. O propósito seria impulsionar “o setor naval brasileiro e gerando empregos e desenvolvimento nessas regiões”.
Quanto a Hidrovia Paraná Paraguai o BNDES considera que o projeto contribuirá para melhorar o escoamento da produção de minério, potencializando a Hidrovia Paraguai-Paraná, ao mesmo tempo que fomenta a construção naval nacional. Avalia ainda como estratégico para a “descarbonização” da matriz logística brasileira.
Um equívoco recorrente
Ao final repete um mantra consolidado, mas equivocado: “Modal hidroviário representa redução de 95% das emissões em relação ao rodoviário e de 70% em relação ao ferroviário”, cálculo em geral feito com base no volume transportado por quilometro. Ocorre que na Hidrovia Paraná Paraguai os produtos transportados devem percorrer mais de 3.200 quilômetros a partir de Corumbá.
A LHG como braço da J&F assumiu todos os compromissos da Vale?
A Hidrovias Brasil SA (HBSA), através de uma subsidiária constituída no Uruguai (Hidrovias del Sur SA), firmou em 2012 contrato de 25 anos com a Vale Internacional SA para a compra, operação e manutenção de empurradores e frota de barcaças para transportar até 3,25 milhões de toneladas por ano de minério de ferro de Corumbá (MS), no Pantanal brasileiro, para portos na Argentina e no Uruguai. Neste arranjo estiveram envolvidos com empréstimos o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento. O contrato valeria, portanto, até 2037.
A pergunta (J&F assumiu todos os compromissos da Vale?) se fundamenta no fato de textos jornalísticos publicados quando da compra da Vale pela J&F trouxeram a informação de que a segunda assumiria todos os compromissos da primeira.
Os cálculos ambientais/climáticos foram considerados pelo BNDES para o financiamento?
O Pantanal e a bacia do rio Paraguai, que o abastece, enfrentam nos últimos anos um quadro de seca, o que afeta a navegabilidade do rio. Se considerarmos os últimos 5 anos e um calado para as barcaças carregadas de minério de 1,50 metros, nos últimos 60 meses o Paraguai não teve as condições ideais de navegação em 31 deles.
Teria o BNDES considerado tal fato?
A LHG Logística é o braço de logística da mineradora LHG Mining, que faz parte do Grupo J&F. “O Fundo da Marinha Mercante e o BNDES foram fundamentais garantir a competitividade dos estaleiros brasileiros frente a concorrentes estrangeiros que apresentaram um custo inicial até 20% menor”, diz o presidente da LHG Mining, Aguinaldo Filho, segundo a nota publicada.
“O investimento representa um incremento de 16% da frota nacional de transporte de carga para navegação interior (em rios, lagoas e canais) e a geração de cerca de 5,5 mil empregos diretos e indiretos, a maior parte deles nas regiões Norte e Nordeste, onde serão aplicados 87% dos recursos aprovados. O financiamento também viabiliza a construção destas embarcações no Brasil, em meio à forte concorrência internacional de grandes players, como a China, que é maior construtor naval do mundo e cujas embarcações custariam aproximadamente 20% menos”, diz a nota do BNDES.
“Esta é uma operação que contribui para o desenvolvimento da produção nacional, gerando milhares de empregos com qualidade, impulsionando a descarbonização com um transporte mais limpo e reativando a indústria naval, que faz uma competição internacional difícil, com países como China e Singapura”, explica o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, na nota.
Segundo explica o texto do BNDES, o projeto permitirá a ampliação do escoamento na logística de minérios que são extraídos em Corumbá (MS) e carregados nas barcaças, atravessando 2.500 km pela hidrovia, cruzando o Paraguai, até chegar ao terminal marítimo de Nova Palmira, no Uruguai, onde são carregados em navios de longo curso.
As prioridades para o financiamento foram concedidas pelo Conselho Diretor do Fundo da Marinha Mercante (CDFMM), formado pelo Ministério dos Portos e Aeroportos e outros ministérios, além de entidades representativas da sociedade civil e bancos públicos.