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CAR: Decreto coloca em risco a biodiversidade do Pantanal

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O decreto nº 14.273, de 8 de outubro de 2015, regulamentando o Cadastro Ambiental Rural no Pantanal no estado do Mato Grosso do Sul, apresenta sérios problemas que podem levar a um impacto enorme ao Pantanal, protegido pela Constituição Federal como patrimônio nacional, e no Código Florestal em seu artigo 10º, tratado como área de uso restrito.

Leia o decreto sobre o CAR no Diário Oficial 

O decreto normativo do governo do estado confronta o código florestal ao dar permissão para o uso difuso das Áreas de Preservação Permanentes (Apps), considerando a criação de bois como atividade de baixo impacto. Entretanto, nas considerações que direciona o decreto não há nenhuma referência que ajude a concluir que isto seja uma verdade. O código florestal permite atividade de baixo impacto (pontuais) em apps, enquanto que o decreto permite uso generalizado. Ainda, quanto às apps, não cita sequer como as baías (lagoas perenes ou intermitentes do pantanal) seriam tratadas, e isso confronta o código florestal porque há métricas para definição de faixas marginais na proteção deste tipo de ambiente. Finalmente, as salinas do pantanal são tratadas como app, conforme indicação da Embrapa, mas não confere proteção. Permite o gado nestes ambientes e usam o tamanho das salinas para definir o grau de proteção. Estes são ambientes sensíveis que merecem atenção total, e como nas apps, não deveriam ter permitidas o acesso do gado.

O CAR permite também o uso pecuário nas reservas legais, e define condições subjetivas para seu uso. Neste sentido, confronta o código florestal, no qual o mesmo não é permitido nestas áreas. Na prática, decreta o fim ou a inexistência de reservas legais, com a justificativa de que o boi diminui o risco de incêndio. Os incêndios no pantanal são causados por pessoas, que colocam fogo em época errada, perdendo o controle e causando incêndios em áreas florestais, quando este deveria ser usado para manejo da vegetação apenas em áreas de vegetação campestre e de cerrado.

Na área de uso restrito, quando se refere à substituição de vegetação nativa para formar pastos, o decreto cita que a relevância ecológica será a medida usada para estabelecer as porcentagens permitidas nas fazendas. No entanto, examinando as notas técnicas da Embrapa, fica evidente que o decreto adota porcentagens arbitrárias muito acima da relevância ecológica calculada pela instituição de pesquisa que utilizou como base conhecimentos sobre a biodiversidade nos diferentes ambientes, e que deu suporte às porcentagens indicadas pela referida instituição.

O decreto permite a remoção de 50% dos ambientes florestais e 60% de todo o resto (que trata como “formações campestres” de forma equivocada). Estes percentuais vão resultar em uso intensivo do pantanal, desrespeitando o artigo 10º do código florestal, que determina que o pantanal é área de uso restrito. Além disso, o impacto na biodiversidade deve ser bastante significativo, e isso confronta o conceito de sustentabilidade ecológica que, segundo a Embrapa, deve incluir a manutenção da biodiversidade. Este nível de modificação conflita totalmente com este conceito.

A determinação também trata os diversos ambientes do pantanal com uma simplificação exagerada, por separar em apenas duas categorias (ambientes florestais e campestres) os mais de 50 ambientes conhecidos e já publicados pelo Instituto Nacional de Áreas Úmidas (INAU). Com base nessa simplificação artificial e arbitrária, sem base cientifica da complexidade natural, o decreto estabelece as porcentagens também arbitrárias para remoção da vegetação nativa, generalizando-as, portanto, sobre a grande variedade de ambientes que existem no pantanal.

Como a biodiversidade se distribui de forma diferenciada entre os diversos ambientes, esta simplificação permite que diversos habitats possam ser eliminados, juntamente com as espécies que deles dependem. Os ambientes tratados como campestres no decreto incluem cerrado, campo de murundu, paratudais, carandazais, campos limpos, campos sujos, pimenteirais, cambarazais, espinheirais, campos inundáveis, vazantes, brejos, e uma infinidade de outros tipos de habitat, que deveriam ter tratamento diferenciado em função de sua importância para a biodiversidade. Para todos estes ambientes reunidos, o decreto define uma porcentagem de 60% para a remoção, sem discriminar.

Além disso, o decreto determina que as porcentagens devam ser aplicadas sobre as áreas totais das fazendas, e não sobre as parte passíveis de manejo, ou seja, descontando-se as reservas legais e as áreas de preservação permanente. Assim, como as apps e as reservas legais seriam utilizadas livremente pelo gado, o resultado do decreto será um impacto profundo no pantanal, caracterizando uso intensivo das fazendas no sistema, e sem garantir que sejam ecologicamente sustentáveis. O documento também desconsidera que, com o aumento das pastagens de braquiária, mais gado caberia por área, e então o impacto sobre as apps e as reservas legais serão mais intensivos comparados aos dias atuais.

Assim, o decreto do governo do estado afronta o código florestal e aparentemente só levou em conta o aspecto econômico ou a intenção de se intensificar o uso do pantanal.

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