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Comunidade tradicional atingida por barragem dá início a piscicultura

6 minutos de leitura

Por Luana Campos (ECOA)

Às margens do rio Correntes, entre os municípios de Sonora (MS) e Itiquira (MT), (r)existe uma comunidade chamada de Porto dos Bispos. Essencialmente formada por pescadores, a comunidade tradicional desenvolveu seus modos de vida, seus conhecimentos e suas atividades econômicas baseadas no rio. Uma dinâmica que atravessou gerações em harmonia com o ambiente, garantindo a continuidade e abundância do Correntes.

Desde 2004, no entanto, a comunidade tem padecido com o rastro de destruição causado pela instalação da usina hidrelétrica (UHE) Ponte de Pedra na região, que trouxeram impactos ambientais, econômicos e sociais negativos em efeito cascata.

O rio morreu

Relato do pescador, Sérgio Pereira, é comum em comunidades atingidas por barragens no Pantanal.

O sobe e desce contínuo das águas do rio Correntes, causado pela abertura e fechamento das comportas da UHE Ponte de Pedra, afastou os peixes da região. Pelo mesmo motivo, o rio deixou de ser navegável. Se o barco desce o rio, é grande a possibilidade de ficar encalhado. E soma-se a esse fator o sério risco de acidentes, pois a descida brusca da água pode fazer com que o barco se choque contra pedras, colocando em perigo a própria vida de pescadores e turistas.

Sem peixe. Sem navegação. O turismo na região definhou e os moradores de Porto dos Bispos – que viviam da venda de pescado, trabalhavam como piloteiros, eram proprietários de barcos e/ou pequenas pousadas – passaram a viver em condições de miséria. Para se ter noção 70% das pousadas foram fechadas.

Abandonadas pelo poder público e privado, e sem a possibilidade de se manter, a maioria das pessoas – que só sabem viver do rio – acaba migrando para as cidades. Sem preparo para outras atividades elas não são absorvidas pelo mercado de trabalho e acabam nas periferias, aumentando o número de marginalizados.

(Re)Existência

Há cerca de 10 anos, a ECOA acompanha a situação que ocorre na comunidade, auxiliando as famílias a localizarem seus direitos e buscando alternativas para geração de renda sustentável – que garantam não apenas sua permanência no território, mas respeitem seu ritmo de vida e mantenham sua ligação com o rio e com a pesca.

Moradores aprenderam todo o processo de criação de alevinos. Foto: André Restel (ECOA)

Com aporte do Fundo Socioambiental CASA, a ECOA, em sintonia com os anseios das famílias atingidas pela barragem, tem fomentado a piscicultura na região. Com o início do projeto, tanques cavados anteriormente pelos moradores – em uma tentativa frustrada pela falta de aparato e suporte técnico adequados – foram corrigidos, e os primeiros alevinos e a ração para todo o ciclo produtivo foram comprados.

No dia 22 de maio, os moradores receberam treinamento com o médico veterinário, Willer Carrijo Corrêa, que ensinou as famílias sobre manejo adequado, alimentação e doenças na primeira fase da criação dos alevinos. Os peixes devem levar, em média, 9 meses para atingirem o tamanho e peso ideais para consumo e/ou comercialização.

Hidrelétricas no Bacia do Alto Paraguai (BAP): um território sob pressão

Os problemas enfrentados pela comunidade Porto dos Bispos são comuns a outras comunidades do Pantanal, que também foram atingidas pela instalação de UHEs e pequenas centrais hidrelétricas (PCHs).

Atualmente, 52 empreendimentos hidroenergéticos estão em operação na BAP, mas a previsão é de que 101 outras represas sejam instaladas num curto espaço de tempo. Impactos somados causarão danos irreversíveis.

Em setembro de 2018, a Agência Nacional de Águas (ANA) emitiu uma suspensão para os empreendimentos hidrelétricos em rios federais até março de 2020. A justificativa do pedido de suspensão se deve ao estudo que a ANA deu início em 2016 para verificar “os efeitos socioeconômicos e ambientais da implantação desses empreendimentos sobre os demais usos da água e sobre os próprios recursos hídricos”.

Em dezembro de 2018, a ECOA, junto ao Observatório do Pantanal, enviou uma moção aos governos dos estados de Mato Grosso (MT) e Mato Grosso do Sul (MS), pedindo que a suspensão da ANA fosse estendida aos rios estaduais da BAP. Apenas o governo de MS se manifestou sobre o documento, onde afirmou que não poderia acatar a suspensão por temer que o estado enfrente problemas jurídicos com os donos dos empreendimentos.

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