O rio Cabaçal, importante afluente do rio Paraguai, é um berço da biodiversidade no Pantanal. Abrigo de nascentes, suas águas sustentam animais, plantas e comunidades, além de embelezar paisagens encantadoras. No entanto, essa riqueza natural quase foi perdida para um complexo de seis represas hidrelétricas, que ameaçavam o equilíbrio ecológico e o futuro da região.
Um rio ameaçado
O projeto do “complexo hidrelétrico” de seis barragens, proposto para ser instalado ao longo do rio Cabaçal, abrangia os municípios de Reserva do Cabaçal, Rio Branco, São José dos Quatro Marcos, Lambari D’Oeste, Mirassol d’Oeste e Araputanga, todos no Mato Grosso.
Curvelândia (MT), outro município da região, onde está localizada a Vila Cabaçal e onde vivem diversas famílias de pescadores, também sofreria sérias implicações por estar localizado a jusante dos locais onde as represas seriam instaladas.
Os impactos afetariam diretamente a biodiversidade e o modo de vida das comunidades locais. As barragens representavam uma ameaça real e iminente para o futuro do rio e do Pantanal, uma vez que, alterariam a conectividade dos rios, interromperiam o movimento migratório de peixes (por exemplo, o dourado), causariam perda de fauna e vegetação, comprometeriam a qualidade da água e resultariam em grandes perdas socioeconômicas. A pesca, maior fonte de trabalho e renda no Pantanal, e o turismo local, que depende das cachoeiras e cavernas da região, seriam gravemente impactados.
A força da mobilização
Diante da ameaça, empresários, pescadores, o Comitê de Bacia Hidrográfica do rio Cabaçal (CBH Cabaçal), vereadores e organizações ambientais, como a Ecoa e o Instituto Gaia, uniram forças em diversas frentes para impedir a construção das represas.
A Dra. Mariana Lacerda, especialista em direito ambiental e consultora da Ecoa, acendeu o alerta sobre o processo de licenciamento ambiental do “Complexo rio Cabaçal” que estava em andamento na SEMA/MT (Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso), o qual analisou minuciosamente.
VEJA MAIS: Estudo do licenciamento para a construção de 6 barragens no rio Cabaçal, um rio importante para o Pantanal, desenvolvido pela Dra. Mariana Lacerda.
O projeto ignorava a participação dos pescadores tradicionais e dos proprietários de empreendimentos que dependem do rio, como donos de pesqueiros e ranchos. Além disso, sua análise revelou possíveis indícios de corrupção e uma longa lista de processos disciplinares, evidenciando a necessidade de maior transparência. Lacerda também destacou a carência de estudos técnicos mais aprofundados que abordassem os impactos no turismo local e na pesca, fundamentais para embasar decisões mais conscientes e responsáveis.
As audiências públicas trouxeram à tona relatos e argumentos de moradores e empresários, que temiam pela perda de seus negócios e meios de subsistência. Afinal, a degradação do rio reduziria significativamente a visitação turística da região e as oportunidades econômicas associadas ao ecoturismo e à pesca esportiva.
Sérgio Olímpio, mobilizador local e dono de um rancho à beira do rio, expressou sua preocupação sobre a inviabilidade do empreendimento no rio Cabaçal:
“O rio vem baixando com muita frequência. Final de semana consigo atravessar o rio a pé de frente para o meu rancho. Então, não vejo possibilidade nenhuma de implantação do empreendimento no rio Cabaçal” – Sérgio Olímpio
Vitória! O arquivamento dos projetos
Em 26 de abril de 2024, a Secretaria de Meio Ambiente do Mato Grosso (SEMA-MT) anunciou o arquivamento definitivo dos processos de licenciamento das seis barragens no rio Cabaçal. A conquista representa um marco na luta pela conservação do rio, um dos últimos livres de represas no Pantanal.
A pressão exercida por empresários, pescadores, vereadores e organizações ambientais, como a Ecoa e o Instituto Gaia, aliado à mobilização do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Cabaçal (CBH Cabaçal), foi determinante para o arquivamento dos projetos.
A aprovação por unanimidade do projeto de lei na Câmara Municipal de Lambari D’Oeste, que declarou o rio Cabaçal como “Monumento Natural e Patrimônio Paisagístico e Turístico”, vedando qualquer obra que altere drasticamente sua paisagem, incluindo a construção de hidrelétricas, mostrou o reconhecimento da importância do rio para a região e o compromisso com sua preservação.
O futuro do rio Cabaçal
A vitória contra as represas é um passo importante, mas é fundamental que a sociedade civil se mantenha vigilante e ocupe espaços políticos e de diálogo, como as cadeiras dentro dos Comitês de Bacia Hidrográfica.
VEJA MAIS: Como a sociedade pode fazer a diferença na gestão da água? Entenda o papel dos Comitês de Bacia Hidrográfica
A manutenção do rio Cabaçal como um dos poucos rios da Bacia do Alto Paraguai sem barragens é essencial para a segurança hídrica do Pantanal. Por isso, a Ecoa segue comprometida na defesa dos rios livres e na promoção de políticas de gestão sustentável dos recursos hídricos.
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