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Conservação e tradição – A importância das comunidades tradicionais

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Foto: Iasmim Amiden

O Decreto Federal nº 6.040/2007 estabeleceu que Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs) são definidos como grupos culturalmente distintos que se reconhecem como tal. Possuem formas próprias de organização social e utilizam territórios e recursos naturais essenciais para sua continuidade cultural, social, religiosa e econômica. As práticas e conhecimentos desses povos são gerados e transmitidos ao longo das gerações por meio da tradição.

Essas comunidades mantêm uma organização social única e utilizam os recursos naturais disponíveis para sustentar sua cultura e modo de vida, o que inclui a prática de atividades como caça, pesca e coleta de plantas. Elas são fundamentais para a conservação de territórios e proteção da biodiversidade.

A Constituição Federal garante aos PCTs o direito de preservar e valorizar sua cultura, língua, costumes e tradições. Eles também têm acesso garantido à terra e aos recursos naturais necessários para sua sobrevivência e cultura, respeitando as normas de cada grupo. Além disso, podem participar de forma livre e informada nas decisões que afetam seus direitos e interesses. A Constituição estabelece que o Estado deve criar políticas públicas adequadas, apoiando e incentivando suas iniciativas para promover o desenvolvimento sustentável, respeitando sua diversidade e autonomia, e assegurando sua inclusão social e econômica.

Atualmente, existem 28 tipos de povos e comunidades tradicionais reconhecidos oficialmente no Brasil, entre esses grupos estão os pantaneiros.

Desafios enfrentados

Essas comunidades enfrentam constantes ameaças de atividades como agropecuária, garimpo, desmatamento e exploração descontrolada de recursos naturais. Um exemplo é a situação da comunidade da Barra do São Lourenço, perto da Serra do Amolar, na fronteira oeste do Pantanal, abordada na dissertação de mestrado de André Luiz Siqueira, diretor da Ecoa, defendida em 2015 na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), sob orientação do professor Aguinaldo Silva. O estudo explora os conflitos socioambientais causados pela criação de áreas protegidas ao redor dessa comunidade.

A Serra do Amolar é conhecida por sua rica biodiversidade, que mistura características do Chaco, Amazônia e Cerrado. Na década de 90, foram criados o Parque Nacional do Pantanal e as Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) na região. No entanto, as restrições das unidades de conservação levaram à expulsão dos habitantes locais, que formaram a comunidade da Barra do São Lourenço na margem esquerda do rio Paraguai. A dissertação de Siqueira mostra que esses moradores foram impedidos de realizar suas atividades tradicionais, como pesca e coleta de recursos naturais, e enfrentaram tensão e vigilância constantes por parte das reservas.

Foto: Arquivo Ecoa

Comunidade tradicional Barra do São Lourenço

A comunidade leva “Barra” no nome por estar situada a montante de Corumbá (MS), na margem esquerda do rio Paraguai, perto do ponto onde este encontra o rio Cuiabá, na fronteira entre Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. O acesso à Barra do São Lourenço só é possível por barco ou avião. De chalana, a viagem a partir de Corumbá, o centro urbano mais próximo, dura mais de 26 horas. A cultura dos moradores reflete a miscigenação de indígenas, europeus, africanos e habitantes de países da Bacia do Prata (Brasil, Bolívia, Paraguai, Uruguai e Argentina).

Ela é composta por 27 famílias. Em 2012/13, seus direitos foram parcialmente reconhecidos com a emissão de um Termo de Autorização de Uso Sustentável (TAUS) pela Secretaria do Patrimônio da União (SPU). Também foi concedido um TAUS coletivo para uma área comum na margem direita do rio, onde as famílias encontram refúgio e acesso a água potável durante as cheias. Este local é chamado de Aterro do Socorro.

A comunidade hoje

Atualmente, a principal fonte de renda da comunidade tradicional da Barra do São Lourenço é a pesca artesanal profissional, como a coleta de iscas vivas. Além disso, muitos moradores cultivam produtos para subsistência, adaptando-se às cheias e secas da região. Algumas famílias se dedicam à colheita de arroz selvagem e outros produtos da biodiversidade para processamento e venda. Também é realizada a coleta de mel de abelhas nativas.

A comunidade tradicional possui uma escola municipal que atende também as comunidades tradicionais vizinhas de Mangueiral, Chané e Porto Amolar.

A Serra do Amolar enfrenta vários desafios. A dificuldade de transporte devido à distância das cidades e ao alto custo, e o acesso limitado apenas por via fluvial, são problemas significativos. Esses e outros fatores ameaçam a continuidade da comunidade, perda cultural e separação das famílias pantaneiras. Apesar de viverem em um Patrimônio Natural da Humanidade, essas famílias ainda estão à margem da sociedade e enfrentam condições de pobreza.

Silvia Helena

Jornalista do Núcleo de Comunicação da Ecoa.

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