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Júlia González, síntese da potência pantaneira

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Foto: Sérgio Seven

O Pantanal está de luto. Faleceu hoje Júlia González, liderança comunitária da Área de Proteção Ambiental Baía Negra, em Ladário (MS), onde viveu por mais de 20 anos. Dona Júlia dedicou sua vida à causas socioambientais, travando diversas batalhas em busca de melhorias para sua comunidade.

Ao ver a ribeirinha pela primeira vez, a impressão poderia ser de que se tratava de uma senhora frágil, delicada. Mas bastava poucos instantes em sua companhia para que essa opinião mudasse completamente. Júlia era a síntese da potência pantaneira. Tratava-se de uma mulher de fibra, exemplo da força das comunidades tradicionais, que lutava todos os dias por aquilo que acreditava. E as batalhas travadas não foram em vão: resultaram em diversas conquistas para a comunidade onde vive.

Assim como os outros moradores da APA, dona Júlia sobrevivia da natureza ao seu redor: era pescadora, extrativista, artesã e guiava turistas pelo Pantanal que chamava de lar. Na área protegida de cerca seis mil hectares, poucos espaços eram desconhecidos para a ribeirinha. A pé ou de barco, explorar a região fazia parte da sua rotina diária.

Foto: Dra Rosa/Comitiva Esperança

“O Pantanal significa tudo para mim, talvez eu não consiga viver sem esse contato com a natureza. E se eu puder ajudar a cuidar do que tem aqui, com carinho né, vou continuar fazendo porque gosto. Foi uma das frases que Júlia me falou em uma das vezes que conversamos, o que sintetiza a ligação que possuía com o local onde vivia. 

Quando questionada se sairia dali, a resposta era imediata: nada a faria deixar seu lugar. Tal afirmação se mostrou concreta após os incêndios de 2020, quando o fogo destruiu 60% da APA Baía Negra. Também foi confirmada diante da difícil situação causada pela seca que castigou o Pantanal nos últimos anos. 

É de se esperar que tais condições fossem motivo para desânimo. Contrariando as expectativas, dona Júlia se mostrava esperançosa e, em nossas conversas, afirmava possuir fé em dias melhores. Apesar dos desafios enfrentados, a ribeirinha dizia se sentir responsável por animar os outros moradores da comunidade, por fazer todos persistirem. 

Júlia foi um grande parceira da Ecoa, participando ativamente de diversos projetos desenvolvidos na APA Baía Negra. Além disso, desde 2018 fazia parte da Rede de Mulheres Produtoras do Cerrado e Pantanal (CerraPan). 

Sua luta serviu de inspiração para muitos. Em 2018, foi uma das personagens no documentário ‘Vidas do Pantanal’, do diretor Marco Carvalho, que revela dificuldades e recompensas da vida no Pantanal contadas pelos próprios moradores da APA Baía Negra.

Mais recentemente, também tive a oportunidade de entrevistá-la para o podcast ‘E nós aqui embaixo?‘, onde Júlia falou sobre as dificuldades que ela e outros moradores da APA passaram durante e após os incêndios de 2020. Suas palavras deixam também transparecer a persistência e garra que eram partes da sua essência.

Neste momento, o sentimento que fica é a gratidão por tê-la conhecido e ouvido suas palavras, além da vontade de continuar se inspirando em sua história. Obrigada por tudo, dona Júlia! 

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