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Patrimônio Mundial em Chamas: O Pantanal é o “Lago Ameaçado do Ano 2021”

14 minutos de leitura

Este texto tem por base o documento produzido pelo Global Nature Fund (GNF), através da Rede Living Lakes, e a Ecoa, através de Iasmim Amiden e André Luiz Siqueira.

 

Um triste recorde: o Pantanal é a primeira área úmida a receber pela segunda vez o título de “Lago Ameaçado do Ano” (tradução do título original em inglês Threatened Lake of the Year). O Global Nature Fund (GNF) e a Rede de Lagos Vivos apresentam este prêmio anualmente por ocasião do “Dia Mundial das Áreas Úmidas”, em 2 de Fevereiro, a um lago ou a uma área úmida que está  altamente em perigo devido à intervenção humana. A destruição da beleza natural Sul-Americana tem causas diferentes. As medidas necessárias para proteger a onça-pintada, a anta e outros animais. por outro lado, são claras. Elas exigem o compromisso determinado das pessoas no local, mas também na Europa, cujo consumo influencia o conjunto de ecossistemas.

Radolfzell no Lago Constança, 02.02.2021:André Luiz Siqueira está muito preocupado: “Não me lembro de que alguma vez choveu tão pouco aqui nos meses de verão como neste momento. Mas precisamos da chuva. Se não chegar logo, e se não houver muito, a próxima temporada de incêndios será definitivamente pior que a última”. Pior? Já no período de verão brasileiro de Dezembro de 2019 a Março de 2020, o Pantanal, situado em maior parte no Brasil, mas também estendendo-se ao Paraguai e à Bolívia, registrou 40% menos chuva do que nos anos anteriores. No ano passado, foram registrados os piores incêndios na região e a maior seca dos últimos 60 anos.  Foram queimados mais de 4 milhões de hectares no Pantanal, consumindo cerca de um terço da maior área úmida continental do planeta, de acordo com Siqueira.

Foto: Natalina Mendes

Incêndios e o fogo criminoso: Uma escala devastadora

O diretor da organização brasileira Ecoa – Ecologia e Ação, com a qual a Global Nature Fund e a Living Lakes cooperam na região, calcula: “Mais de 40.000 quilômetros quadrados arderam no Pantanal. Isto corresponde a uma área de 4 milhões de campos de futebol. E estes não são apenas números: sinto por casa pessoa que sobrevive nesta região, sinto por cada árvore e cada animal que não consegue fugir desta situação ou morre de fome após os incêndios, porque não consegue mais encontrar alimento. O número de animais mortos também está na casa dos milhões. E os efeitos devastadores desses incêndios criminosos no cenário Sul-Americano, mas também no cenário mundial, ainda não puderam ser totalmente avaliados.”

É normal que ocasionalmente ocorram incêndios no Pantanal. Infelizmente, é também uma prática comum para os agricultores limparem suas áreas cultivadas. Recentemente, esses incêndios têm se espalhado cada vez mais por áreas naturais. Os cientistas são quase unânimes em que uma grande parte dos incêndios devastadores de 2020 pode ser atribuída ao uso do fogo para o desenvolvimento de novas terras agrícolas.  A pecuária, a cana-de-açúcar e o cultivo de soja estão florescendo no Brasil – alimentadas por uma enorme demanda externa e impulsionadas por um governo liderado pelo presidente Jair Bolsonaro, cujas políticas econômicas minam sistematicamente as regulamentações brasileiras e internacionais de conservação da natureza e proteção ambiental.

Espiral para baixo: O Pantanal seca

Como o Serviço Científico do Bundestag aponta em uma recente publicação sobre o Pantanal, a área florestal na zona úmida diminuiu em um quarto desde os anos 80. Em contraste, a área utilizada para a agricultura nesta região mais do que duplicou no mesmo período. A situação é exacerbada pela mudança climática global. Em comparação com a região amazônica, que tem que lutar com problemas semelhantes, mas recebe maior atenção internacional, a perda de área florestal no Pantanal leva ao aumento da temperatura regional e à redução das estações chuvosas. Isto resulta em uma falta de água para evaporação suficiente, que de outra maneira, forma uma densa cobertura de nuvens sobre a região . Estas nuvens amoleceriam a radiação solar e, assim, protegeriam a terra de secar. As áreas secas são, em última análise, mais suscetíveis a incêndios – um círculo vicioso.

Foto: Nathaly Feitosa

Com o seu segundo prêmio ao Pantanal como “Lago Ameaçado do Ano”, o Fundo Mundial para a Natureza (GNF) e a Rede de Lagos Vivos, coordenada por ele, formula novamente o objetivo de quebrar este círculo vicioso. A fim de preservar o que resta do Patrimônio Mundial da UNESCO com sua biodiversidade única, é necessária uma ação repensada e determinada das pessoas no local, mas também na América do Norte e na Europa. “Este é um evento único para nós”, diz a presidente da GNF Marion Hammerl, “porque já nomeamos o Pantanal como o Lago Ameaçado do Ano em 2007″. Mas circunstâncias extraordinárias exigem medidas extraordinárias. Há 14 anos, a ameaça ao hotspot da biodiversidade no Pantanal já era aguda. No entanto, estamos surpresos e chocados com o desenvolvimento dramático dos últimos meses. Se não agirmos agora – imediatamente! – de fato, em breve não restará nada que valha a pena proteger no Rio Paraguai. Isso seria uma enorme perda”.

GNF: “Lago Ameaçado do Ano 2007 – Pantanal”

Ajuda aguda e reviravoltas: Formas de sair da crise dos incêndios

Os parceiros locais da GNF e da Living Lakes estão fazendo tudo o que é humanamente possível para minimizar os efeitos dos incêndios na flora e fauna. Por exemplo, funcionários da organização parceira – Brazilian Living Lakes – Fundação Ecotrópica trouxeram muitas toneladas de alimentos para os animais do Pantanal que estão ameaçados pela fome na área de incêndio e os distribuíram em ilhas de alimentação – uma linha de vida antas, capivaras e outros animais que foram privados de tudo pelo fogo. Os animais feridos recebem cuidados veterinários. A Ecoa – Ecologia e Ação, segundo André Luiz Siqueira, está treinando voluntários de grupos e comunidades da região para serem brigadistas e lidar com as chamas e trabalhar com a prevenção. “Eles são nossos heróis em uma grande batalha”, disse Siqueira. “Infelizmente, é uma luta que muitas vezes parece sem esperança”.

Brigadas voluntárias
Foto: Elias Campos

O alívio agudo é imperativo, mas a missão para o Lago Ameaçado 2021 requer medidas mais abrangentes. “As soluções para proteger e usar de forma sustentável o Pantanal estão sobre a mesa há muito tempo! Mas o governo brasileiro está fazendo exatamente o contrário”, sublinha Marion Hammerl. “As leis de proteção ambiental no Brasil devem ser ampliadas, as leis existentes devem ser implementadas e as violações devem ser punidas consistentemente. Nosso prêmio é um chamado a Jair Bolsonaro e seu Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles para fazer uma reviravolta em suas políticas. E ao resto do mundo para não fazer vista grossa e fazer pressão para que isso aconteça imediatamente!”.

Ganância global: O futuro do Pantanal será decidido em três continentes

Mas a questão não é um assunto puramente brasileiro, Hammerl continua: “Por um lado, é necessário um diálogo diplomático aberto sobre a situação no Pantanal com os estados vizinhos Paraguai e Bolívia. Até agora, isto não ocorreu de forma alguma. Além disso, precisamos quebrar as ligações negativas entre os métodos de produção não-sustentáveis na América do Sul e os padrões de consumo norte-americanos e europeus”. Com nossas decisões de consumo e nutrição, nós, na Europa, contribuímos massivamente para a ameaça ao Pantanal. Três quartos da soja produzida no mundo inteiro é utilizada como ração para animais de abate. Quase todas as rações de soja na Alemanha e na UE são provenientes da América do Sul. Fatos que a GNF já apontou no ano passado em uma carta aberta de protesto ao governo brasileiro, a fim de afirmar claramente a responsabilidade europeia.

A carta de protesto aberta da GNF e da Living Lakes

“A premiação do Pantanal como Lago Ameaçado do Ano 2021 no Dia Mundial das Áreas Úmidas deve ser um alerta para deter a dinâmica destrutiva neste precioso conjunto de ecossistemas”, enfatiza Hammerl. Se isto não for bem sucedido, surge um cenário que, segundo os cientistas, se torna mais provável a cada ano que passa: “Colapso ecológico. Isso transformaria a diversidade viva ao redor de rios, lagos e pântanos em um deserto nas próximas décadas.” Cabe a todos nós evitarmos este pesadelo.

GNF: “Lago Ameaçado do Ano 2021 – Pantanal”

Sobre o Global Nature Fund (GNF) e Living Lakes

Desde 1998 o Global Nature Fund (GNF) tem trabalhado para a natureza e o meio ambiente desde Radolfzell no Lago Constança. Como coordenadora da rede mundial Living Lakes, a GNF, juntamente com mais de 130 organizações parceiras e 112 lagos e pântanos em 56 países em todos os continentes, promove a proteção da água, chama a atenção para os perigos que ameaçam os lagos, rios e pântanos ao redor do globo e desenvolve soluções para sua preservação.

Contato

Global Nature Fund – Fundação Internacional para o Meio Ambiente e a Natureza

Fritz-Reichle-Ring 4

78315 Radolfzell

Udo Gattenlöhner, Diretor Gerente

Telefone +49 7732 9995 80

E-Mail: gattenloehner@globalnature.org

Website: www.globalnature.org

 

Ecoa – Ecologia e Ação

Rua 14 de Julho, 3169, Centro

79002-333

Campo Grande, MS, Brasil

Iasmim Amiden, Coordenadora de Comunicação

Telefone +55 65 984719163

E-mail: iasmim@riosvivos.org.br

Website: www.ecoa.org.br

 

Iasmim Amiden

Jornalista e Coordenadora do Programa Oásis da Ecoa.

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