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Usinas são risco para peixes como piraputanga e pacu peva, aponta pesquisadora

6 minutos de leitura
Cuiabá, a cidade e o rio (Foto: Jeff Belmonte)
  • Lei que proíbe represas ao longo do rio Cuiabá é contestada pela Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa (Abragel), que representa interesses da Maturati Participações
  • A Maturati Participações é responsável pelos projetos de seis PCHs no Rio Cuiabá
  • Represas causam impactos para fauna, flora, pessoas que dependem do rio e para a economia local
  • Pesquisadora destaca que até níveis elementares da cadeia alimentar podem ser afetados
  • Rio Jauru é exemplo de que as propostas para redução de danos não serão o suficiente

Mikhail Favalessa, Midiajur

A construção de seis usinas hidrelétricas traria riscos para toda a cadeia alimentar no Rio Cuiabá, aponta uma pesquisadora e professora da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) em entrevista ao Midiajur. As mudanças no ecossistema poderiam afetar até mesmo espécies de peixes que estão entre as mais comercializadas na baixada cuiabana, como piraputanga e pacu peva.

O Supremo Tribunal Federal (STF) julga nesta semana uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) que pretende anular a lei estadual nº 11.865/2022. Promulgado no passado, o texto proíbe a construção de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) e Usinas Hidrelétricas (UHEs) em toda a extensão do Rio Cuiabá.

Leia também: O dia em que represas foram proibidas no rio Cuiabá

A lei é questionada pela Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa (Abragel), que representa interesses da Maturati Participações, responsável pelos projetos de seis PCHs no Rio Cuiabá.

Solange Ikeda Castrillon é doutora em ecologia e recursos naturais, e professora credenciada nos Programas de Pós Graduação em Ciências Ambientais e Profágua.

Ao Midiajur, a professora da Unemat explica que a “fragmentação” do rio com os seis empreendimentos “traz uma preocupação para toda a sociedade do Pantanal”.

“É importante compreender que rios como o Cuiabá, rios livres, como deve ser, servem para a reprodução dos peixes. Os nossos peixes do Pantanal são migratórios, que sobem os rios para reproduzir. E seis fragmentos trarão consequências nessa reprodução”, aponta.

Além de afetar diretamente os peixes em seu ciclo de migração e reprodução, níveis mais elementares da cadeia alimentar do rio podem ficar comprometidas com as obras das usinas.

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“A mudança na qualidade da água, a partir da retenção de sedimentos, vai trazer consequências no próprio sistema, que depende da forma como é hoje. Essa mudança pode trazer consequências lá na base da cadeia alimentar, nos pequenos animais que estão ali, nos fitoplanctons, nos zooplanctons, que dependem de uma água com qualidade, que é o que nós temos ainda no Pantanal”, pontua Solange Ikeda.

A tentativa de instalação das seis PCHs entre a Usina de Manso e Cuiabá não acontece de forma isolada. A professora lembra que há outros 43 empreendimentos já instalados no Pantanal, e outros 100 em fase de projeto em todo o bioma.

Os possíveis danos não se limitam à fauna, e têm influência sobre a vida das populações que vivem próximas do Rio Cuiabá.

“Muito provavelmente nós vamos ter impactos irreversíveis, que também são relacionados à cultura de um rio. É um rio que traz a soberania alimentar para os pescadores, para os ribeirinhos, traz fonte de renda para a sociedade do seu entorno, e traz garantia de peixes para todo o Pantanal. E permite ao Pantanal ser o que é: uma das maiores áreas úmidas do mundo. Essa perda vai ser lamentável no futuro quando nós estamos criando situações como essa que estamos vivenciando no Rio Cuiabá”, argumenta.

Os responsáveis pelas usinas alegam que os projetos possuem estruturas que reduziriam os danos aos peixes e microorganismos do rio. A principal medida seria uma espécie de “elevador” para peixes, que permite passagem das espécies.

“Não vimos exemplos deste sistema dando certo em Mato Grosso. Se você vai ao Rio Jauru, tem ocorrido o inverso. Os peixes ficam acumulados na saída da água e houve relato de pesca ilegal e exagerada nestes locais. E ainda, geralmente, depois que se constrói o empreendimento, ficam poucas pessoas da empresa cuidando destes locais”, relata Solange Ikeda.

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Para a professora da Unemat, a longo prazo, as mudanças na qualidade da água com tantos empreendimentos, no Cuiabá e em outros rios do Pantanal, afetará toda a cadeia ecológica: “É uma questão de escolha”, resume.

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