A imagem não é tão nítida. Está um pouco escura, sem tanta definição. Foi captada à noite, por meio de um equipamento de armadilhamento fotográfico. Mesmo assim, duas fotos foram suficientes para intrigar pesquisadores e moradores do Mosaico Sertão Veredas-Peruaçu, no Norte de Minas Gerais. Embora houvessem alguns antigos relatos na região, nunca um lobo-guará de cor preta foi registrado oficialmente. Nem em fotografias, nem em bibliografias. Nem ali, nem em nenhum outro lugar do mundo. A partir de agora, esse canídeo diferenciado está no radar de especialistas da ONG Instituto Biotrópicos que faz um trabalho de monitoramento de mamíferos da região, que conta com apoio do WWF-Brasil por meio do Programa Cerrado-Pantanal.
A cor avermelhada é uma das características mais marcantes do lobo-guará. Por isso, houve desconfiança de algumas pessoas ao se depararem com as primeiras imagens do animal de cor preta captadas na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Veredas do Acari, próximo à cidade de Chapada Gaúcha (MG).
“Na literatura não existem informação sobre um lobo-guará dessa cor. Na região, o povo falou que já tinha sido visto há muitos anos, mas nunca foi fotografado. Pesquisamos e chegamos à conclusão de que se trata do primeiro registro de um lobo-guará preto no mundo. A morfologia é a mesma de outros lobos-guarás: perna longa, orelha grande, é muito característico da espécie, independente da coloração. Entendemos a desconfiança por ser inédito, fotos à noite onde não dá para ver como toda a clareza, mas trata-se de um lobo-guará com certeza”, confirma Guilherme Ferreira, biólogo do Biotrópicos responsável pelo protocolo de armadilhamento fotográfico.
O objetivo a partir de agora é aprender mais sobre esse animal. Seus hábitos, comportamento e, principalmente, o mais intrigante: porque ele tem essa coloração? “A nossa avaliação vai continuar. Pretendemos instalar mais armadilhas fotográficas naquela área e quem sabe obter uma imagem bem clara, no final de tarde ou início da manhã”, anuncia Ferreira.
O trabalho de armadilhamento fotográfico é uma iniciativa do Instituto Biotrópicos. No local onde foi flagrado o animal, a parceria é com o Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais (que fez a capacitação de guarda-parques para operar o equipamento) e a Rede ComCerrado (que forneceu material fotográfico para ser usado). O trabalho de monitoramento de mamíferos do Biotrópicos que conta com o apoio do WWF-Brasil, desde 2012, é feito no Parque Nacional Cavernas do Peruaçu.
Mais de 30 espécies registradas
A avaliação comparativa da biodiversidade em áreas protegidas na região do Mosaico Grande Sertão Veredas-Peruaçu feita pelo Instituto Biotrópicos é inédito e registrou mais de 30 espécies de mamíferos em fotos ou filmagens (81% de todas as espécies de maior porte do Cerrado). Entre eles, a anta, o tamanduá-bandeira e o gato do mato pequeno que são animais ameaçados de extinção internacionalmente. Outros, como onças e jaguatiricas, veados e capivaras, também foram observados (veja vídeos no Camera traps Brasil).
“Estamos certos de que o nosso apoio ao Instituto Biotrópicos contribui na preservação da fauna do bioma Cerrado, particularmente dos mamíferos que lá habitam. A parceria está alinhada com a estratégia de atuação do WWF-Brasil e do Programa Cerrado-Pantanal. Sem dúvida, o conhecimento e valorização da riqueza natural dessa região contribuirá significativamente para sua conservação. Nesse sentido, visando resultados cada vez melhores e robustos, pretendemos prolongar a nossa parceria com a ampliação do trabalho e expansão para outras áreas daquela região”, exalta Julio Cesar Sampaio, coordenador do Programa Cerrado-Pantanal do WWF-Brasil.
Para o próximo ano, estão previstas a aquisição de novas câmeras, capacitação de mais técnicos dos parques (responsáveis pelas trocas de pilha e cartões de memória) e instalação de equipamento em outras Unidades de Conservação do Mosaico Sertão-Veredas Peruaçu.
No âmbito da parceria entre o Instituto Biotrópicos e o WWF-Brasil, com base nos dados já coletados, será lançada uma publicação em formato de guia de campo sobre os mamíferos de médio e grande porte da região ainda no primeiro semestre de 2014.
“Essa parceria com o WWF-Brasil é importante porque dá condição de manter o trabalho por mais tempo. Podemos analisar mais UC’s e implementar protocolos padronizados nelas. Com isso, conseguiremos atingir dois objetivos: o de avaliar com manutenção da biodiversidade e entender como as diferentes categorias de unidade de conservação protegem a comunidade de mamíferos”, finaliza Guilherme Ferreira, do Instituto Biotrópicos, que realiza pesquisas com grandes mamíferos no Norte de Minas Gerais desde 2004.
Fonte: Bruno Moraes – WWF Brasil