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Comissão recebe dossiê sobre elevada contaminação de agrotóxico nas águas do Cerrado

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agrotóxico no cerrado
foto: Laura Arias | Pexels

Relatório enviado sobre a contaminação das águas do Cerrado por agrotóxico traz dados colhidos pela Fiocruz em sete estados brasileiros

 

José Carlos Oliveira, Agência Câmara de Notícias

A Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados recebeu, nesta quinta-feira (1º), o documento “Vivendo em territórios contaminados: um dossiê sobre agrotóxicos nas águas do Cerrado”, que acaba de ser lançado pela Campanha Nacional em Defesa do Cerrado, uma rede de 56 movimentos e organizações sociais. O relatório técnico traz dados alarmantes colhidos pela Fundação Oswaldo Cruz nos estados do Centro-Oeste (GO, MT e MS) e do chamado MATOPIBA (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), dominados por monocultura de grãos, como soja e milho.

A pesquisadora da Fiocruz Aline Gurgel explicou que 90 substâncias foram analisadas em pontos de coleta escolhidos em conjunto com comunidades afetadas. A presença de agrotóxico na água foi constatada em todos os estados pesquisados.

“Glifosato, Atrazina e 2,4-D, que estão entre os cinco mais consumidos do Brasil, apareceram em grande parte das amostras. No total, encontramos 13 agrotóxicos. No estado do Maranhão, chegamos ao ponto de encontrar nove agrotóxicos diferentes em uma única amostra de água em um poço que fica – olha que coincidência – a 35 metros de distância de um campo de soja. Essas substâncias podem ter os seus efeitos tóxicos somados ou potencializados”, explicou.

Outro dado preocupante: cinco agrotóxicos detectados na pesquisa da Fiocruz não estão na portaria do governo federal que regulamenta os parâmetros a serem monitorados na água. Aline Gurgel avalia que qualquer dose de agrotóxico diferente de zero traz danos à saúde e ao meio ambiente, de imediato ou a longo prazo. Ela classifica a legislação brasileira de “permissiva”, sobretudo diante de normas mais rigorosas, como a da União Europeia.

“A nossa legislação não é suficientemente protetiva para a gente. Fica muito difícil de se fazer uma vigilância quando a gente sequer tem um conjunto representativo de substâncias previstas nas normativas brasileiras para serem monitoradas”.

Leia também: Quem resiste- os impactos dos agrotóxicos para comunidades tradicionais no MS

 

Comunidades afetadas

Representantes das comunidades afetadas pela contaminação retrataram o drama diário. Raimunda Nepomuceno é do Quilombo Cocalinho, no Maranhão, onde foram encontrados nove agrotóxicos em uma única amostra de água.

“Com veneno, não temos terra, não temos água. A gente precisa do nosso Cerrado vivo. Do jeito que está, não tem nenhuma proteção”, lamentou.

Dilvanise das Chagas mostrou os efeitos da contaminação na Comunidade Gerazeiras, que vive de agricultura familiar em Formosa do Rio Preto (BA) e sofre com a pulverização de agrotóxico nos campos de soja do oeste baiano.

“A gente mora no vale. Quando eles (fazendeiros) fazem essa pulverização em cima da serra, o vento vem contaminando o que a gente tem no vale. As folhas ficam pintadas de agrotóxico e insetos mortos”.

Consideradas o “berço das águas”, as nascentes do Cerrado alimentam as principais bacias hidrográficas do País, o que também acaba disseminando a contaminação por agrotóxicos. Entre as recomendações da Campanha Nacional em Defesa do Cerrado estão mutirão de saúde nas populações afetadas, criação de canais de denúncia e monitoramento sanitário e ambiental.

A Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida denunciou efeitos nocivos dos cerca de 1.800 novos ingredientes ativos liberados no governo Bolsonaro. A consultora técnica de vigilância em saúde ambiental do Ministério da Saúde, Mariely Daniel, informou que 612 municípios integram a estratégia conjunta de redução de risco (Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Agrotóxicos-VSPEA) e há perspectiva de reforço dessas ações no Plano Plurianual do governo Lula (PPA 2024/27).

“Essa é uma agenda prioritária que a gente sabe que tem muito que avançar, estender para demais municípios e trabalhar a vigilância popular e participativa no desenvolvimento de ações preventivas de risco”, afirmou.

Leia também: Agrotóxicos – ‘estamos todos participando de uma experiência química global’

Organizador do debate na Comissão de Meio Ambiente, o deputado Nilto Tatto (PT-SP) alertou para a gravidade do tema.

“Quem acompanha as propagandas de ‘agro é pop, agro é tech’ acaba não conhecendo o impacto que isso tem, em especial para as comunidades mais vulneráveis e para as populações que estão ali onde a monocultura tem esse modelo que usa muito veneno”, disse.

Tatto lamentou as resistências a esse debate no Congresso Nacional. Ele lembrou que o Senado está prestes a aprovar em definitivo a proposta (PL 6299/02) que facilita o registro de agrotóxicos, apelidada de “PL do veneno”. Enquanto isso, o projeto de lei (PL 6670/16) que cria a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pnara) aguarda a votação do Plenário da Câmara desde 2018, ainda sem perspectiva de consenso.

 

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