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Financiando clima e desenvolvimento

8 minutos de leitura

Via Valor 
Por Carsten Sandhop e Philippe Orliange

O “One Planet Summit” – a Cúpula de um “Planeta Único”, que acontece hoje em Paris, tem o propósito de incentivar a mobilização coletiva em prol do financiamento da luta contra as mudanças climáticas, dois anos depois do Acordo de Paris e dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Na véspera da Cúpula, bancos de desenvolvimento e outras instituições terão reuniões para impulsionar essa mobilização.

Ao criar o International Development Finance Club (IDFC), 23 bancos de desenvolvimento da América Latina, África, Europa e Ásia demonstraram que o financiamento do clima e o financiamento do desenvolvimento são apenas duas faces da mesma moeda. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) foi um dos membros fundadores desse clube, que foi presidido desde a sua fundação, em 2011, pelo Banco de Desenvolvimento da Alemanha KfW, e atualmente é comandado pela Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD).

Nesse contexto, a AFD e o KfW foram designados pelos seus governos para serem as maiores fontes de acréscimo dos financiamentos para o clima dos dois países. No caso da França e da AFD o objetivo é cumprir com o compromisso do governo francês de contribuir com EUR 3 bilhões anuais e até EUR 5 bilhões em 2020, incluindo uma meta de EUR 1 bilhão por ano apenas para adaptação. No caso da Alemanha, o propósito é manter alto os financiamentos do clima e implementar as diversas iniciativas do governo alemão. Em 2016, o KfW alocou EUR 4,8 bilhões (ou 66% dos seus novos compromissos no valor de EUR 7,2 bilhões de euros) para a proteção do clima e do meio ambiente em países emergentes e em vias de desenvolvimento.

Desse modo, a Cúpula tem a ambição de sinalizar o papel fundamental que as instituições financeiras públicas têm em conduzir a mobilização coletiva e alavancar os recursos necessários para cumprir com as metas definidas. O desempenho dos bancos de desenvolvimento representa hoje a chave para enfrentar os desafios das mudanças climáticas, seja fomentando a mudança da matriz energética, acompanhando novas formas de desenvolvimento urbano sustentável e socialmente inclusivas, ou incentivando uma gestão racional dos recursos hídricos.

Os bancos públicos de desenvolvimento são parceiros e financiadores diretos das políticas públicas. Esse modelo tem um equivalente em cada país: na França, ele é desenvolvido pela própria AFD junto à Caisse des Dépôts et Consignations (CDC, o equivalente à Caixa Econômica Federal brasileira). Na Alemanha, pelo sistema dos bancos de fomento em nível federal e estadual. Na América Latina (a nível regional), pela Corporação Andina de Fomento (CAF). No Brasil, os bancos públicos de desenvolvimento (sejam federais, regionais, ou estaduais) são instituições comprometidas com o desenvolvimento econômico e social de seus respectivos territórios , e têm uma responsabilidade forte na implementação do NDC (Nationally Determined Contribution, Contribuição Nacionalmente Determinada) brasileiro.

Aliás, esse papel é ainda mais apropriado, pois a adequação dos objetivos a serem atingidos para que os países tornem suas economias sustentáveis, com o tipo de recursos proporcionados pelos bancos públicos, é relevante, especialmente no Brasil – onde os financiamentos de longo prazo fornecidos pelo Sistema Nacional de Fomento respondem à demanda por projetos de infraestrutura sustentável que o país precisa. De forma geral, os valores que essas instituições movimentam estão na casa de bilhões e trilhões de dólares, o que significa dizer que têm uma dimensão financeira sistêmica. Dessa forma, parece-nos que os bancos públicos são atores fundamentais na aplicação financeira da agenda do clima.

A ampliação da cooperação que os bancos têm desenvolvido entre si é um exemplo das novas coligações que foram criadas no marco da implementação do Acordo de Paris e dos ODS. Bancos bilaterais europeus como o KfW ou a AFD desenvolveram parcerias financeiras e técnicas com o BNDES, o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), a CEF entre outros. O BDMG, por exemplo, destaca-se pela forma com a qual vincula-se à agenda global – clima e ODS – e por uma atuação de financiador ativo do desenvolvimento regional, com o apoio da AFD.

Outros bancos começam a despontar nessa direção, como por exemplo o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), que desenvolveu um programa de financiamento de “consumo e produção sustentável” (PCS), e está desenhando uma estratégia para internalizar os ODS (junto ao Pnud). Esses exemplos realçam o grande desafio transformativo que representa essa agenda para essas instituições financeiras, bem como a relevância das parcerias para angariar mais recursos em favor do clima.

Por último, quando se fala de clima e implementação dos ODS, qualquer país do mundo deve ser considerado como “país em desenvolvimento”, no sentido de que a transição para modos de produção e de consumo sustentáveis é uma tarefa para todos, e com prioridade absoluta. O papel chave dos bancos de desenvolvimento na realização desses objetivos globais aparece na combinação de dois fatores que os legitimam: o fato de serem atores públicos encarregados de financiar as políticas públicas; a sua capacidade financeira para alavancar e orientar recursos para novos mercados e produtos sustentáveis.

Aliás, a inovação financeira surge como uma prioridade para os bancos públicos (temática veiculada pela Associação Brasileira de Desenvolvimento em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento), que veem as inovações nessa área (green bonds, garantias, risco cambial, etc.) como oportunidades de melhorar a competitividade e a sustentabilidade da sua oferta, além de tornarem-se atores mais resilientes do SNF e gestores dos seus próprios riscos.

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