Via Valor Econômico
Por Bettina Barros
O Ministério do Meio Ambiente deu a largada para a sua primeira grande ofensiva para tentar frear o desmatamento no Cerrado, um bioma ainda pressionado pelo agronegócio que não encontra mais meios de expansão em larga escala na Amazônia brasileira. A partir de junho, o Serviço Florestal Brasileiro (SFB), ligado à Pasta, dará início à elaboração do primeiro inventário florestal do bioma – um mapeamento minucioso da cobertura vegetal existente -, a exemplo do que já foi feito em outras regiões do país. Paralelamente, o Ministério financiará a implementação do Cadastro Ambiental Rural (CAR) em Estados e municípios do Cerrado, na tentativa de acelerar a regularização ambiental de propriedades rurais particulares. As duas ações receberão recursos da ordem de R$ 170 milhões, financiadas em grande parte por fundos internacionais voltados ao combate às mudanças climáticas.
O inventário florestal é uma ferramenta importante na estratégia de proteção ambiental, com a qual o governo federal pretende nortear políticas efetivas de recuperação e conservação de recursos naturais. Com a crescente pressão para a abertura de terras para a produção de carne e grãos, o Cerrado tornou-se o bioma que mais sofreu alterações com a ocupação humana, atrás da Mata Atlântica. Considerando a área original de 204 milhões de hectares, já perdeu 47,84% da cobertura de vegetação para pasto e lavouras de soja.
Por esse motivo, o foco inicial das ações será justamente na área de maior potencial para a expansão da fronteira agrícola: Matopiba. A confluência dos Estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e o oeste da Bahia soma 70,3 milhões de hectares, 34% da área do Cerrado.
De acordo com Joberto Veloso de Freitas, diretor do SFB, o governo investirá R$ 5,8 milhões no levantamento apenas em Matopiba, o primeiro de seis lotes a serem analisados no inventário florestal. O recurso virá do Forest Investment Program (FIP), oriundo do Fundo de Investimentos Climáticos e administrado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
Para tanto, serão contratados 100 profissionais, entre engenheiros florestais, agrônomos, biólogos e mateiros, diz Veloso. Eles percorrerão 1.640 pontos de coleta de dados, distribuídos a cada 20 Km, e terão como tarefa medir árvores, coletar amostras de solo e material botânico, entre outros aspectos.
“A intenção é conhecer a fundo essa floresta. Hoje só temos informações sobre a perda da floresta”, diz Veloso. Conhecê-la é também uma forma de esvaziar o discurso de que “não existe árvore no Cerrado”, argumento comum de muitos produtores rurais para justificar a alteração do uso do solo na região.
Após a conclusão do primeiro lote, em Matopiba, os trabalhos de mapeamento prosseguirão nas áreas de Cerrado do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás. A previsão é que o mapeamento do bioma esteja concluído já em 2018.
O Matopiba também estará no centro das ações para o avanço do CAR no Cerrado, ainda que outras localidades do bioma também sejam contempladas. Carlos Eduardo Sturm, diretor de Cadastro e Fomento Florestal do SFB, afirma que o foco será a capacitação e estruturação das secretarias ambientais de 8 Estados e o Distrito Federal e de 47 municípios. Além de órgãos ambientais, pequenos produtores, com até quatro módulos fiscais, serão beneficiados com recursos.
A estratégia de avanço do CAR no Cerrado contará com orçamento de cerca de R$ 150 milhões -entre recursos do FIP e do orçamento da Pasta – e é importante porque oficializa a cobertura verde remanescente em áreas privadas, detecta déficits e impede futuros desmatamentos ilegais nessas propriedades.
Além da biodiversidade, o Cerrado é vital para o abastecimento nacional de água, uma vez que abriga as nascentes das três maiores bacias hidrográficas da América do Sul: a do Amazônia-Tocantins, São Francisco e a do Prata. Apesar disso, nos últimos 14 anos o plantio de soja no bioma cresceu 87%, quase 70% em áreas já ocupadas com outras culturas e pastagem. Na região do Matopiba, porém, o grão foi semeado sobretudo sobre a vegetação nativa, conforme estudo publicado pela Agroicone.