Revista Fapesp
Quanto mais a vegetação nativa do Cerrado cede área para a agricultura, mais reduzido se torna o volume de chuvas disponíveis à própria atividade agrícola. O alerta é de um estudo conduzido por Stephanie Spera, da Universidade Brown (EUA), e colaboradores, inclusive a ecóloga brasileira Marcia Macedo, do Centro de Pesquisa Woods Hole (Global Change Biology, 29 de março).
Eles analisaram imagens de satélite feitas durante 11 anos na região conhecida como Matopiba, que abrange os estados de Tocantins, Maranhão, Piauí e Bahia, e viram um grande avanço da fronteira agrícola. Em 2003, havia 1,2 milhão de hectares (ha) cultivados. Em 2013, a agricultura ocupava 2,5 milhões de ha. Três quartos do avanço do plantio ocorreram sobre terras antes cobertas por vegetação nativa, quase toda de Cerrado. Também a partir das imagens de satélite foi possível avaliar a quantidade de água lançada ao ar pelas folhas das plantas, a evapotranspiração. Na estação das chuvas, de outubro a abril, quando a lavoura está crescendo, a evaporação nas áreas com plantio é similar à verificada nas áreas com vegetação nativa.
O problema ocorre no período seco, quando as lavouras estão na entressafra. Durante os meses de estiagem, o volume de evapotranspiração é em média 60% menor nas áreas com cultivo do que nas com vegetação nativa. O risco é de que a falta da umidade do ar agrave a seca e acabe por adiar o início da estação chuvosa, encurtando o período produtivo. Como a umidade circula por correntes de ar, os autores temem que os efeitos dessa seca não fiquem restritos ao Cerrado e cheguem à Amazônia. Uma forma de reduzir o problema é plantar dois cultivos por ano na mesma terra, como o milho safrinha em seguida à soja. Essa prática alonga o período de crescimento das plantas e pode representar uma redução menor da evapotranspiração.