Observatório do clima
Claudio Angelo do OC
Quer ver o nível do mar subir ainda mais rápido em cidades litorâneas como Santos, Rio e Recife? Não? Então torça por uma erupção vulcânica catastrófica na próxima década. Essa escolha difícil nos foi apresentada nesta quarta-feira (10) por um trio de pesquisadores americanos.
Os cientistas argumentam que as medições de elevação dos oceanos no planeta ao longo das últimas décadas não refletem sua real relação com o ritmo das mudanças climáticas. Elas andam, por assim dizer, com um “viés de baixa”, por causa de um fenômeno natural: a erupção do monte Pinatubo, nas Filipinas, em 1991.
A explosão do Pinatubo foi a segunda mais forte do século 20. Quase 850 pessoas morreram devido à quantidade colossal de cinzas e pedaços quentes de rocha expelidos pela montanha. Os prejuízos foram estimados em US$ 3,8 bilhões e o custo humano só não foi maior porque a erupção foi prevista com antecedência, e os moradores do entorno, evacuados. No total, algo entre 20 e 30 bilhões de toneladas de cinzas foram depositadas na estratosfera.
Os impactos foram globais: cinzas do Pinatubo rapidamente se espalharam por todo o planeta, atingindo até mesmo o Brasil e rebatendo de volta parte da radiação solar. O resultado foi que, nos dois anos seguintes à explosão, o mundo resfriou cerca de 0,6oC.
Em um estudo publicado on-line no periódico Scientific Reports, John Fasullo, do NCAR (Centro Nacional de Pesquisa Atmosférica), e mais dois colegas argumentam que o efeito da erupção também foi sentido nos oceanos. Segundo eles, o resfriamento global pós-vulcão fez o nível do mar cair 6 milímetros devido à redução do ritmo de aquecimento da superfície oceânica. Mal comparando, é como desligar uma chaleira com água fervente: o volume da água na panela, que havia se expandido, cai de imediato.
A coincidência, aqui, é que os primeiros satélites dotados de altímetros a laser – instrumentos usados desde então para medir as variações globais do nível do mar com extrema precisão – foram lançados apenas em 1992. Nos primeiros anos de operação desses instrumentos, o mar começava também a se recuperar do efeito da erupção, e a absorver calor de forma aparentemente mais rápida. Daí a elevação detectada pelos altímetros no nível do mar nos anos 1990 ter sido de 3,5 milímetros por ano, caindo para 2,7 milímetros por ano na década seguinte – algo que os cientistas nunca conseguiram explicar direito.
“A primeira década teve uma elevação anômala associada com isso [a erupção] e, portanto, há uma desaceleração aparente que é artificial”, disse Fasullo ao OC.
Removendo o efeito do vulcão numa simulação que usa um grande conjunto de modelos climáticos computacionais, o trio americano obteve uma aceleração constante, segundo eles mais próxima do real efeito do aquecimento global sobre a expansão térmica do mar. E foi capaz de fazer uma previsão ousada, que poderá ser verificada logo: “Na medida em que as influências antropogênicas continuam a crescer (como resultado tanto da maior concentração de gases de efeito estufa quanto da diminuição das emissões antropogênicas de aerossóis), uma aceleração detectável do nível do mar tende a emergir, excedendo o ruído da variabilidade climática nos próximos anos”.
Fasullo e colegas chegam a pôr um número nessa aceleração: pelo meio do século, ela deve ser de 0,12 milímetro por ano além do que se esperaria. Parece pouco?
“Nós não sabemos, por exemplo, se 0,12 mm é o que o futuro trará, trata-se de um limite inferior”, diz o cientista do NCAR. “Para alguém que vive perto do nível do mar e com pouca capacidade de adaptação, isso tende a ser um grande motivo para preocupação.”