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Texto originalmente publicado em 19 de março de 2009

Via Revista Exame

Por Luiza Dalmazo

As fontes de energia mais comuns no mundo são quatro: petróleo, gás, urânio e carvão. Mas existe outra, conhecida como “o quinto combustível”, que sempre foi o patinho feio da história. Vem sendo deixada de lado há anos, mas tem potencial para se tornar um lindo cisne em tempos de preocupações com o meio ambiente. É um recurso limpo, barato, disponível e que reduz as emissões de carbono na atmosfera: a eficiência energética.

Os primeiros passos nessa área foram dados durante a crise do petróleo, em 1973, mas não é preciso voltar tanto no tempo para entender do que está se falando. Aqui no Brasil a eficiência fez parte do dia-a-dia de cidadãos e empresas durante o apagão de energia de 2001. Muitas das práticas de economia aprendidas nas duas crises já foram incorporadas à rotina, e a economia não exige um esforço consciente. Mas é possível fazer muito mais. Com iniciativas para o aproveitamento adequado, a demanda esperada de energia elétrica pode cair até 38% no país na próxima década, o equivalente à geração de 60 usinas nucleares de Angra III ou à de seis hidrelétricas de Itaipu.

“A economia poderia chegar a 33 bilhões de reais na conta nacional de eletricidade dos consumidores até 2020”, diz Karen Suassuna, analista do programa de conservação da organização não-governamental WWF-Brasil.

O primeiro ponto que precisa ser esclarecido quando se fala em economia de energia é que isso não significa abrir mão do conforto em casa. Também não quer dizer que será necessário reduzir a atividade econômica. Pelo contrário. A ideia por trás da eficiência energética é fazer o mesmo – ou mais – utilizando menos. Isso significa ter o bom senso de apagar a luz ao sair da sala, é claro. Mas o empurrão decisivo será dado com a adoção de novas tecnologias, como fez a rede varejista americana Wal-Mart.

A empresa lançou há três anos um projeto ambicioso de redução das contas de luz em suas lojas em todo o mundo. As unidades brasileiras já registram quedas nos gastos de cerca de 15% em relação aos índices de 2005. “Mudamos desde os painéis do teto, para usar melhor a luz do sol, até as lâmpadas das geladeiras”, diz Elisabete Freitas, diretora de construção da rede. As lâmpadas a que ela se refere são as baseadas em diodos emissores de luz (LEDs, na sigla em inglês), que têm vida útil 50 vezes maior e consomem apenas um quinto da energia elétrica das incandescentes.

No projeto da ponte Octavio Frias de Oliveira, um dos novos cartões-postais de São Paulo, a iluminação também utiliza a nova tecnologia, o que representa um custo 75% menor em comparação com as soluções tradicionais. Parece pouco quando se pensa nas lâmpadas de uma residência. Mas, tendo em vista que a iluminação é responsável por 19% de todo o consumo mundial de eletricidade, a substituição das lâmpadas incandescentes por LEDs é um passo enorme.

“A iluminação passaria a responder por apenas 4% do consumo total”, diz Yoon Young Kim, vice-presidente da divisão de luz da Philips Brasil.

Plano arrojado

Alguns avanços são voluntários, como a substituição da iluminação pública, e outros ditados por regulamentação, como as metas impostas a fabricantes de eletrodomésticos de alto consumo, como geladeiras e aparelhos de ar condicionado. Há também um grande esforço em curso para racionalizar o uso de energia em edifícios, que podem responder por 40% do consumo nos países ricos, segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Mas existem esforços que não buscam ganhos incrementais, e sim um olhar completamente inovador sobre a questão. A que talvez seja a ideia mais arrojada do mundo em eficiência energética vem do meio do deserto, mais precisamente dos Emirados Árabes Unidos. Batizado de Masdar City, o complexo que está sendo erguido em Abu Dhabi deve ser a primeira cidade 100% livre de emissão de dióxido de carbono. Com uma área de 6 000 quilômetros quadrados e uma população prevista de 50.000 habitantes, Masdar City quer ser um laboratório a céu aberto para experimentos com o uso racional da energia.

O plano é que Masdar use apenas 20% da eletricidade de uma cidade de tamanho comparável. A maior parte da energia virá do sol. Todo o lixo será reciclado, e o esgoto será convertido em combustível – que não será usado em carros, pois a ideia é que os deslocamentos sejam feitos em veículos movidos a eletricidade. O governo do emirado de Abu Dhabi quer que o empreendimento, avaliado em 15 bilhões de dólares, sirva de ímã para empresas que desenvolvem energia limpa. A GE já tem planos de se instalar na cidade, que terá um centro de pesquisas montado em cooperação com o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT).

Não deixa de ser irônico que o milagre de eficiência representado por Masdar City fique encravado na região que tem um dos maiores índices de consumo de energia per capita. A intenção dos árabes, porém, é aprender o máximo possível para um futuro em que o petróleo possa perder importância como fonte de energia. Outro objetivo do projeto é exportar para o resto do mundo o conhecimento aprendido com as novas técnicas desenvolvidas em Masdar.

A busca por eficiência energética também pode vir de lugares mais improváveis, como empresas de tecnologia da informação. Uma das ideias consideradas mais promissoras é a da chamada rede elétrica inteligente, ou smart grid, em inglês. Com a nova tecnologia, as empresas de distribuição teriam informação em tempo real sobre o uso de cada um de seus consumidores. De posse dessa informação, poderiam ser feitos melhor gerenciamento e convênios com os usuários para, por exemplo, oferecer descontos para quem concordar em ter o ar-condicionado desligado automaticamente em horários de pico. Os defensores da rede inteligente enxergam um futuro em que o serviço terá semelhanças com o de telefonia celular: quem usar a eletricidade em horários “nobres” pagará mais, e vice-versa.

Dotar de “inteligência” a rede elétrica não é um objetivo simples. Seria necessário distribuir sensores e chips num sistema antiquado, vasto e extremamente distribuído. Mas as pesquisas vão de vento em popa, e o plano é um dos pontos centrais da política energética do governo do presidente americano Barack Obama. Outra indicação do interesse das empresas do Vale do Silício no tema foi um recente anúncio do Google. O gigante da internet divulgou uma iniciativa batizada de Google Power Meter (medidor de energia). Trata-se de um software capaz de medir o uso de eletricidade de uma residência em tempo real, mostrando em um gráfico em que momentos do dia o consumo é mais alto e quais eletrodomésticos gastam mais. Por enquanto, o programa está apenas em teste – mas o fato de o tema do consumo responsável despertar o interesse de uma empresa como o Google já mostra o alcance da ideia da eficiência.

É claro que o interesse pela eficiência energética anda de mãos dadas com a atividade econômica. Com a desaceleração da economia mundial e a queda vertiginosa do preço do petróleo, é provável que o assunto não esteja no topo da agenda por algum tempo. Mas trata-se de um assunto que não poderá ser esquecido, como já ocorreu no passado. Um estudo do McKinsey Global Institute, braço de pesquisas da consultoria, indica que o uso mais racional da energia poderia garantir metade do esforço global de manter a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera em um nível aceitável de 550 partes por milhão. Inovar – e ter bom senso com um recurso tão precioso como a energia – é hoje uma questão de sobrevivência para o planeta.

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