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Energia é o setor que continuará sendo um importante eixo de investimento chinês no Brasil nos próximos anos, diz estudo do CEBC

16 minutos de leitura

Por Luiza Rosa.

 

A Ecoa acompanha instituições que financiam o desenvolvimento priorizando os investimentos da China, do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), do Banco Interamericano e do Banco Mundial, por entender que os recursos devem seguir parâmetros de proteção ambientais e sociais rígidos. Não devem financiar obras que degradam o ambiente e tragam problemas sociais como o deslocamento de populações, situações de ocorrência comum. O texto a seguir está de acordo com essa estratégia.

 

Em 2019 os investimentos da China no Brasil cresceram 117%, tendo somado US$7,3 bilhões. Em 2020, em decorrência da pandemia de COVID-19, caiu 74%, atingindo US$1,9 bilhão, o menor valor registrado desde 2014. É o que diz o estudo “Investimentos chineses no Brasil: histórico, tendências e desafios globais (2007-2020)”, lançado na semana passada, no dia 5 de Agosto, pelo Conselho Empresarial Brasil-China, com autoria de Túlio Cariello, diretor de pesquisa e conteúdo do CEBC, e financiado pelo banco Bradesco.

A China é o segundo maior investidor no Brasil, atrás apenas dos Estados Unidos. O estado que mais recebeu investimentos chineses no Brasil, até 2020, é São Paulo, que teve 31% do total de projetos de financiamento chineses anunciados e aprovados. Para mais informações, veja o gráfico 9, que está na página 29 do estudo do CEBC, que apresenta a participação das unidades federativas na atração de investimentos chineses.

O setor mais visado pela China no Brasil continua sendo o de energia, concentrando-se em empreendimentos de hidrelétricas com aportes de grandes estatais chinesas como a State Grid e China Three Gorges.

Segundo Cariello, energia é o setor que continuará sendo um importante eixo de investimento chinês no Brasil nos próximos anos. Para uma análise mais detalhada, veja o gráfico 6, que está na página 23 do estudo do CEBC, que mostra a concentração de investimentos chineses por setor de atividade produtiva.

 

Investimento chinês não implica em débito do Brasil em relação à China

Mas o aumento da presença econômica da China no Brasil não implica em dívida do Brasil em relação ao país asiático. É o que explica a pesquisadora do Centro de Política em Desenvolvimento Global, da Universidade de Boston, Rebecca Ray: “Investimento estrangeiro direto (Foreign Direct Investment, em inglês) é como geralmente nomeamos quando uma companhia estrangeira está investindo em um país. Isso não implica em débito entre um país e outro, significa que os donos dos empreendimentos irão lucrar em decorrência do andamento dos projetos.”.

O que implica em débito, segundo Ray, entre um país e outro, são os empréstimos. “Esses empréstimos são o que registramos em nossa base de dados em financiamento, que mantemos junto com o Inter-American Dialogue”. O Latin-American Finance Database, que mapeia os investimentos feitos pelo Banco de Desenvolvimento da China e o Banco da China de Importações e Exportações para países da América Latina e Caribe pode ser acessado aqui.

Rebecca Ray é a pesquisadora responsável por um banco de dados sobre financiamento chinês no mundo, que utiliza o recurso de um mapa. Além de monitorar os financiamentos chineses, monitora a viabilidade ambiental dos empreendimentos. Você pode acessá-lo aqui.

Imagem do banco de dados China´s Overseas Development Finance, do qual Rebecca Ray é a pesquisadora responsável.

 

Influência geopolítica

A influência geopolítica da China sobre o Brasil cresceu, pela via da influência econômica, mas os países latino-americanos “recebem propostas de acordos comerciais com muitos países e avaliam-nas com o objetivo de assumir o melhor compromisso possível. Isso implica em maior diversificação de parcerias em vez de a garantia de influência maior a apenas um país”, explica Ray. Segundo ela, há duas maneiras de um país exercer influência geopolítica sobre o outro: uma delas, que é a forma mais direta, é a resolução de disputas investidor-estado, que são reclamações que investidores internacionais podem fazer quando os governos anfitriões passam reformas que vão de encontro com seus lucros. Isso não ocorre muito no Brasil. Outro modo de um país exercer influência geopolítica sobre outro é quando um investimento estrangeiro familiariza o país anfitrião com companhias envolvidas, o que faz com que o país esteja inclinado a trabalhar com essas empresas no futuro.

 

“Investimentos chineses no Brasil: histórico, tendências e desafios globais (2007-2020)”

Veja abaixo mais informações que o estudo de Túlio Cariello elucida:

 

– Entre 2007 e 2020, empresas chinesas efetivaram 176 empreendimentos no Brasil, com aportes que somam US$ 66,1 bilhões. Houve ainda 64 projetos não concretizados, com valor estimado em US$ 44,5 bilhões.

– Até 2020, o Brasil recebeu 47% dos investimentos chineses na América do Sul.

– 48% do valor do estoque dos investimentos confirmados entre 2007 e 2020 foram direcionados ao setor de energia elétrica – no qual há presença marcante de gigantes como State Grid e China Three Gorges –, seguido por extração de petróleo e gás (28%), extração de minerais metálicos (7%), indústria manufatureira (6%), obras de infraestrutura (5%), agricultura, pecuária e serviços relacionados (3%) e atividades de serviços financeiros (2%). Os 2% restantes foram direcionados a segmentos com participação individual inferior a 2%.

– State Grid e China Three Gorges têm a maioria de seus ativos no exterior localizados no Brasil, com fatias de 48% e 60%, respectivamente.

– Em número de projetos confirmados entre 2007 e 2020, o setor de eletricidade segue na liderança, com 31% do total, mas há um aumento considerável da participação da indústria manufatureira, que fica em segundo lugar, com 28%. Sob essa ótica, aumentam também as participações de projetos em tecnologia da informação (7%), agricultura (7%) e serviços financeiros (6%).

– Em pouco mais de dez anos, empresas chinesas investiram em todas as regiões do Brasil. Há projetos chineses confirmados em 23 das 27 unidades federativas do país. O estado de São Paulo lidera com 31% do número de projetos confirmados entre 2007 e 2020, seguido por Minas Gerais (8%), Bahia (7,1%), Rio de Janeiro (6,7%), Goiás (5,4%) e Pará (4,6%).

– 70% do valor dos investimentos chineses confirmados entre 2007 e 2020 ingressaram no Brasil via fusões e aquisições. Investimentos greenfield e joint ventures têm fatias de 24% e 6%, respectivamente.

– Em número de projetos confirmados entre 2007 e 2020, há uma mudança significativa na configuração da entrada dos aportes chineses. Dos 176 empreendimentos, 48% entraram via greenfield, enquanto 40% foram realizados por meio de fusões e aquisições e 12% a partir de joint ventures.

– Estima-se que 34,5 mil empregos foram criados no Brasil entre 2003 e 2020 por conta da entrada de novos projetos chineses (greenfield), ao mesmo tempo que as aquisições de ativos já existentes mantiveram 140,4 mil postos de trabalho no país.

– Há 16 estatais centrais chinesas com investimentos confirmados no Brasil. São empresas estratégicas para o governo chinês e subordinadas ao Conselho de Estado, uma das mais altas instâncias do aparato político do país asiático. Essas estatais centrais respondem por 82% do valor do estoque de investimentos chineses no país e por 39% do número de projetos. Esse alto percentual é explicado pela forte presença de investimentos nos setores de energia elétrica e extração de petróleo.

– Em 2019, o valor dos investimentos chineses confirmados no Brasil cresceu 117%, tendo somado US$ 7,3 bilhões, apesar da queda de 8,2% nos investimentos diretos da China em todo o mundo no mesmo período. A elevação seguiu a tendência dos investimentos estrangeiros como um todo no Brasil, que tiveram alta de 20% no mesmo ano.

– Desses US$ 7,3 bilhões investidos pela China em 2019, 57% foram destinados ao setor de eletricidade, seguido pelas áreas de extração de petróleo e gás (23%) e obras de infraestrutura (15%).

– A despeito do salto em valor verificado em 2019, o número de projetos confirmados foi reduzido a 25, montante 22% inferior ao de 2018. Também houve menor diversidade de setores, com aportes chineses direcionados a sete segmentos, contrastando com os 12 registrados em 2018.

– Em 2019, pela primeira vez o Nordeste atraiu a maioria do número de projetos chineses no Brasil, com participação de 34%, seguido por Sudeste (27%), Sul (15%), Norte (12%) e Centro-Oeste (12%). O Nordeste também liderou a atração de aportes em termos de valor, com mais da metade do capital investido naquele ano.

– Em 2020, com uma conjuntura internacional complexa marcada por fatores como a pandemia de Covid-19, houve queda de 74% no valor dos aportes chineses confirmados no Brasil, que atingiram US$ 1,9 bilhão, o menor valor registrado desde 2014. O número de projetos caiu para oito, 68% a menos do que em 2019.

– Esse tombo em 2020 foi sentido igualmente nos investimentos estrangeiros de forma geral no mundo e nos aportes do mundo no Brasil, que caíram 35% e 61,5%, respectivamente. Os investimentos não financeiros da China no exterior, de acordo com dados oficiais de Pequim, tiveram redução marginal de 0,4%.

– O setor de eletricidade atraiu 97% do valor dos investimentos chineses confirmados em 2020. Em número de projetos, o segmento manteve a liderança, com participação de 38%, seguido pelas áreas de serviços financeiros (25%), fabricação de aparelhos elétricos (25%) e agricultura, pecuária e serviços relacionados (13%).

– Considerando-se o número de projetos, os investimentos chineses confirmados em 2020 foram direcionados ao Sudeste (78%), Norte (11%) e Nordeste (11%).

– A queda dos investimentos chineses no Brasil em 2020 não foi uma exceção à regra. Importantes receptores de aportes chineses no exterior passaram por situações semelhantes. Naquele ano, houve redução dos aportes na União Europeia e Reino Unido (-43%) e Austrália (-39%), regiões onde há quedas contínuas desde 2017. Os investimentos chineses nos Estados Unidos atingiram seu pico em 2016, com transações equivalentes a US$ 48,5 bilhões, caindo desde então até 2019, quando somaram US$ 6,3 bilhões. Em uma quebra pontual desse movimento, esses aportes cresceram 15% em 2020, atingindo US$ 7,2 bilhões – ainda que o aumento tenha sido reflexo de um número reduzido de aquisições particularmente volumosas.

– Apesar de eventuais altos e baixos em termos numéricos, os investimentos chineses no Brasil têm muito a oferecer a qualquer projeto de desenvolvimento nacional. A China dispõe de incontestável experiência em projetos de construção civil e indústria, que por décadas estiveram entre os principais motores de sua economia. Parcerias nessas áreas poderiam contribuir para a diminuição dos gargalos de infraestrutura que emperram o crescimento brasileiro.

– O setor de eletricidade, no qual as empresas chinesas já estão bem estabelecidas, continuará a ser um importante eixo de atuação no Brasil. As áreas portuária, de transporte e logística, nas quais há projetos em andamento, poderiam ser mais bem exploradas com a atração de novos investimentos, dado o grande potencial de atuação do lado chinês e a urgência brasileira em implementar projetos nesses setores.

– Existem oportunidades de inovação na agenda bilateral que poderiam se beneficiar do crescente avanço da China nas novas fronteiras da tecnologia da informação. A entrada de investimentos chineses nessa área no Brasil ainda é um fenômeno recente e restrito a um número relativamente baixo de atores, mas oferece um grande potencial para projetos ligados a temas como inteligência artificial, economia digital, internet das coisas, redes 5G, cidades inteligentes, dentre outros.

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