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Analistas pedem mais importação para eólica

13 minutos de leitura

Texto originalmente publicado em: 17/02/09

Para a fonte eólica deslanchar na matriz energética brasileira é preciso reduzir o índice de nacionalização (de 70%) dos equipamentos exigido pelo governo federal. A opinião é de especialistas do setor, que defendem um índice menos significativo, capaz de reduzir o custo de instalação das centrais motivadas pela força dos ventos.

O alto índice de nacionalização tem sido um gargalo no setor, porque há poucos fabricantes de equipamentos instalados no Brasil e praticamente 100% da produção local é exportada. Portanto, para comprar em território nacional, além de pagar mais caro, o investidor precisa esperar para o equipamento ser disponibilizado”, diz Marcelo Parodi, presidente da comercializadora Comerc.

Atualmente, a fonte eólica tem participação irrisória na matriz energética brasileira, de apenas 0,36%. A fonte hídrica domina a geração de eletricidade, com quase 70% de participação. Lúcio Reis, diretor-executivo da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace), afirma que o ideal seria reduzir o índice para 40% ou 50%. “Isso porque a carga tributária brasileira é muito alta e é mais rentável importar o equipamento do que comprar o produzido aqui no País, diz Reis.”

Segundo o especialista, hoje, a fabricação nacional pode atender até cerca de 60% de índice de nacionalização, mas a compra dos equipamentos e materiais para atender este índice inviabiliza o
projeto, já que a carga tributária brasileira é alta. “O ideal seria chegar a, no máximo, 50% de nacionalização obrigatória”, diz.

Parodi pontua a crise financeira mundial como mais um motivo para o governo federal reduzir rapidamente o montante obrigatório de equipamentos nacionais nas usinas eólicas. A crise atingiu grandes investidores do setor. “Há encomendas sendo canceladas, por isso trata-se de um bom motivo para o Brasil importar estes equipamentos a um bom preço”, diz o presidente da Comerc.

 

Pode ser um bom negócio

No entanto, para Nivalde de Castro, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a manutenção do índice de nacionalização em 70% pode ser um bom negócio caso o Brasil divulgue amplamente um plano de longo prazo para a energia eólica, como a realização de leilões específicos anualmente. Porém, diz Castro, “só dá para manter o índice em 70% se o Brasil garantir que vai realizar leilões para energia eólica sempre.”

Segundo o professor da UFRJ, a união de um alto índice de nacionalização com a realização periódica de leilões para a venda da energia dos ventos atrairia fabricantes de equipamentos para o País. “Se houver uma demanda contínua, os fabricantes que estão espalhados pelo mundo perceberão o Brasil como um potencial local para instalação de novas fábricas”, comenta, para completar: “Para baratear o custo da geração eólica é preciso ter economia de escala e um planejamento estável.”

Paulo Godoy, presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), por sua vez, considera positivo o alto índice de nacionalização exigido nas usinas dos ventos. “Não
acho que o índice de nacionalização alto está tão intimamente ligado com a viabilização das usinas no Brasil”, comenta. “Índice alto não é um impeditivo e não confio que é bom aumentar a importação”, acrescenta.

 

Consenso entre analistas

Apesar das divergências de opinião em relação ao índice de nacionalização, é consenso entre os especialistas que o Brasil precisa de um projeto de longo prazo para o setor de eólica de forma que o investidor se sinta seguro para aplicar seus recursos no País. Para Godoy há sinais de indústrias do setor interessadas em se instalar no Brasil. “O governo precisa definir regras claras para o setor de eólica e garantir leilões específicos e periódicos para estas usinas. Aí sim o País vai atrair um cluster de indústrias para atender a demanda nacional”, afirma.

“O Brasil precisa aproveitar o potencial eólico e, para isso, é preciso ter um plano firme e de longo prazo para dar segurança ao investidor”, diz Reis, da Anace. O diretor-executivo da associação dos consumidores afirma também que, no ano passado, nos Estados Unidos, foram instalados 3,5 mil megawatts (MW) em centrais eólicas. “Os Estados Unidos implantaram um planejamento estratégico para o setor e muitos fabricantes se instalaram lá”, exemplifica. Reis diz que muitas fábricas dos Estados Unidos, por conta de crise financeira mundial, têm interesse em diluir os seus investimentos. “É a oportunidade para o Brasil atrair estas fábricas, sobretudo com a crise.”

Os especialistas lembram ainda o forte potencial dos ventos brasileiros. Dados do Atlas do Potencial Eólico Brasileiro apontam que o potencial eólico do País é de 143 gigawatts (GW), o equivalente a 10 vezes a potência da hidrelétrica de Itaipu. Atualmente, as usinas em operação têm capacidade instalada para gerar apenas 26,8 MW, sendo que o Ceará participa com quase 65% desta capacidade. As áreas com maior potencial eólico encontram-se nas regiões Nordeste, Sul e Sudeste. Parodi, da Comerc, ressalta ainda que a geração de energia a partir dos ventos não produz resíduos, não polui águas subterrâneas, não afeta a vida vegetal e animal da região e tampouco emite gases do efeito estufa. “Estamos em um bom momento para substituir as térmicas (que geram energia com óleo, carvão ou gás natural) por eólicas”, comenta.

 

Custo de geração

O presidente da Comerc, além de comparar os ganhos ambientais que o País teria com a substituição das fontes (já que as térmicas queimam combustível), salienta a economia e geram CO2 que seria gerada para os consumidores nacionais. “Uma térmica a óleo funcionando custa entre R$ 500 e R$ 700 o megawatt-hora (MWh), enquanto uma eólica não passa de R$ 200 o MWh)”, frisa Parodi.

 

Venda ao mercado livre

Parodi diz, porém, que o custo da geração eólica (que fica entre R$ 180 e R$ 200 por megawatt-hora) ainda é alto para o mercado livre, ambiente em que não há vínculo comum a distribuidora. A eólica é cara para o mercado livre se comparada às PCHs (pequenas centrais hidrelétricas) que entraram em funcionamento até 2002, por exemplo, que têm isenção do custo do fio (que é de R$ 60 o MWh transmitido).

Parodi garante que, se o governo der o mesmo incentivo às eólicas (de isenção do custo do fio), a fonte seria muito mais competitiva e atrairia os grandes consumidores que integram o ambiente de livre contratação de eletricidade. “O efeito da isenção do custo do fio é que você consegue comprar uma energia mais cara sem prejudicar o consumidor”, diz o presidente da Comerc. “Não precisa ser em caráter permanente, mas até a fonte ter ganhos de escala que reduzirão naturalmente o preço da eletricidade”, diz Parodi.

 

Regras para o leilão

Na última quarta-feira, o Ministério de Minas e Energia publicou uma portaria com a proposta de diretrizes para o primeiro leilão de energia eólica, previsto para ser realizado em junho deste ano. A proposta, que ficará em consulta pública até o dia 28, prevê a contratação de energia para suprimento a partir do início de 2010, com duração de 20 anos.

Segundo o ministério, os contratos serão divididos em cinco períodos de quatro anos com o intuito de avaliar a produtividade dos parques eólicos contratados. Ao se encerrar cada quadriênio poderão ser feitos ajustes nos contratos. Além disso o ministério informou que o leilão só valerá para projetos novos.

 

Suez inaugura nova usina

Na esteira do desenvolvimento das eólicas, a Tractebel Energia, controlada pela multinacional Suez, inaugurou, na sexta-feira, a central dos ventos Pedra do Sal, na cidade de Parnaíba, no estado do Piauí. Esta é a segunda usina eólica da Tractebel a entrar em operação o grupo ingressou no setor no final do ano passado com o lançamento da usina Beberibe, no Ceará.

Pedra do Salvai produzir 18 megawatts (MW) por meio de 20 aerogeradores. O investimento total para a construção da central foi de R$ 102,8 milhões. “Este investimento está de acordo com a filosofia da nossa empresa, de ampliar os aportes em fontes alternativas de energia”, afirma Maurício Bähr, presidente do conselho de administração da Tractebel Energia. Segundo Bähr, a participação da empresa na energia eólica pode aumentar, dependendo das condições do edital do leilão previsto para junho deste ano pelo Ministério de Minas e Energia.

 

30 mil turbinas no mundo

Existem, atualmente, mais de 30.000 turbinas eólicas de grande porte em operação no mundo, com capacidade instalada da ordem de 13.500 MW. No âmbito do Comitê Internacional de Mudanças Climáticas está sendo projetada a instalação de 30.000 MW, por volta do ano 2030, podendo tal projeção ser estendida em função da perspectiva de venda dos Certificados de Carbono.

(Foto de capa de Zbynek Burival via Unsplash)

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