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Cana e carvão são maiores preocupações ambientais em MS

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A questão ambiental tem grande relevância em Mato Grosso do Sul, uma vez que o estado abriga parte significativa do Pantanal, considerado pela ONU patrimônio da humanidade e reserva da biosfera. A observação é do superintendente do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) David Lourenço. Em razão da característica singular do estado, a atuação de órgãos controladores da exploração econômica da natureza – como o Ibama – torna-se imprescindível. Esse é um dos assuntos abordados por David nesta entrevista ao site de notícias Midiamax.

David Lourenço é engenheiro agrônomo, formado pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) do campus de Dourados em 1986. Durante o curso, militou no movimento estudantil. Iniciou sua atividade pública em 1997, quando assumiu a Secretaria de Planejamento de Mundo Novo, na gestão da prefeita Dorcelina Folador. De 2001 a 2002, David foi secretário de Fazenda da Prefeitura de Dourados, na gestão de Laerte Tetila. Em 2003, foi chamado pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva para assumir a Secretária Especial de Apicultura. Retornou para Mato Grosso do Sul em 2006 para ocupar o cargo de Secretário de Planejamento. Há cinco meses, David Lourenço se tornou superintendente do Ibama.

Midiamax: Quais são as atribuições do Ibama?

David Lourenço: O Ibama tem, como principal atribuição, a aplicação das políticas nacionais do meio ambiente. Em Mato Grosso do Sul, as maiores preocupações do Ibama dizem respeito à cana-de-açúcar e ao carvão. O Ibama concentra suas ações na busca de proteção dos dois biomas principais do estado, o do Pantanal e o do Cerrado.

Midiamax: Com relação ao carvão, quais os problemas notados pelo Ibama?

David Lourenço: A produção de carvão ocorre através da exploração da floresta nativa da bacia do Pantanal. E isso é um problema sério, considerando que, conforme a ONU [Organização das Nações Unidas], o Pantanal é patrimônio da humanidade e reserva da biosfera.

Midiamax: É possível dimensionar a quantidade de floresta nativa desmatada para a produção de carvão?

David Lourenço: Mato Grosso do Sul produz 4,5 milhões de m³ de carvão por ano. Para cada m³ de carvão produzido é necessário o dobro de lenha. A proporção é de dois por um. Então, para chegar aos 4,5 milhões de m³ de carvão são precisos 9 milhões de m³ de madeira. Cada 100 m³ de floresta nativa ocupa o espaço de um hectare. Assim, se dividirmos os 9 milhões de m³ de lenha, que são necessários na produção de carvão, por cem, que corresponde à quantidade de floresta por hectare, chegamos à conclusão de que o carvão destrói 90 mil hectares de floresta nativa por ano.

Midiamax: Essa produção é nacionalmente relevante?

David Lourenço: Mato Grosso do Sul é o maior produtor nacional de carvão. Há dois meses, a atividade movimentava o equivalente a R$ 500 milhões por ano. É interessante notar que essa produção significativa ocorre justamente no estado onde há grande parte do Pantanal.

Midiamax: Toda a produção de carvão do estado é feita a partir da exploração da floresta nativa?

David Lourenço: Podemos dizer que 99% – para não falarmos a totalidade – de lenha para a produção do carvão em Mato Grosso do Sul são extraídos de floresta nativa. Isso é preocupante pelo impacto sobre o bioma Pantanal.

Midiamax: Como o Ibama acompanha e fiscaliza essa exploração de madeira e produção de carvão?

David Lourenço: Nesse setor ainda há muita informalidade. Mas existe um controle pelo Ibama. O controle da atividade é feito através do registro da unidade produtora no DOF (Documento de Origem Florestal). Esse documento é uma licença obrigatória que a atividade de carvoagem precisa ter para funcionar dentro da legalidade. Mas estima-se que ainda metade das unidades de produção de carvão funciona na informalidade. Além disso, tem o problema das informações falsas. Por outro lado, o setor está buscando se organizar através do Pacto pela Ilegalidade Zero, que visa dar mais qualidade para a carvoagem.

Midiamax: O que está sendo feito para reduzir o desmatamento da floresta nativa na produção de carvão?

David Lourenço: Estamos buscando fazer com que o setor carvoeiro acelere o processo de independência. Essa atividade deve se adequar ao termo de compromisso que determina que o alcance da auto-suficiência em sete anos. Isso significa que, para cada hectare de árvores derrubadas, o produtor de carvão replante a mesma quantidade correspondente. Nessa reposição florestal, os agentes do setor de carvão preferem plantar eucalipto, que é mais vantajoso economicamente para eles. Em seis ou sete, o eucalipto já está pronto para ser processado em carvão, enquanto que árvores da floresta nativa levam cerca de 20 anos para crescer e poder ser exploradas.

Midiamax: E com relação ao setor de siderurgia?

David Lourenço: O setor de siderurgia é importante para o estado por ser uma porta para o crescimento industrial, mas a produção deve ser realizada em conformidade com as regras ambientais. Aqui no estado o impacto desse setor é menor que o do carvão. Nós buscamos acompanhar a atividade para que ocorra dentro da legalidade. A expansão da cana não deve existir em duas áreas. Uma é a Área de Preservação Permanente, que chamamos de APP. São áreas protegidas por abrangerem todos os tipos de cursos de água. O plantio de cana-de-açúcar e a instalação de usinas de álcool devem ser realizados, no mínimo, a 30 metros dos rios e dos córregos. A outra área diz respeito à reserva legal, que deve ser de, no mínimo, 20% da unidade produtora.

Midiamax: O que é exigido do setor de cana para que esteja de acordo com as regras ambientais?

David Lourenço: Algumas normas que devem ser observadas pela cadeia da cana-de-açúcar são, por exemplo, não lançar vinhoto no curso d’água, respeitar o zoneamento ecológico, respeitar a distância legal entre uma usina e outra, obedecer à legislação ambiental. Nós não temos observado muita ilegalidade no setor, o que não significa dizer que não existam problemas.

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