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Flores podem ‘ouvir’ o zumbido de abelhas — e deixar seu néctar mais doce

11 minutos de leitura
Foto: Iasmim Amiden / Arquivo Ecoa
Por Michelle Z. Donahue, National Geographic

 

Mesmo nos dias mais tranquilos, o mundo está repleto de sons: o canto dos pássaros, o sopro do vento entre as árvores e o zumbido dos insetos. A audição tanto do predador quanto da presa está atenta à presença um do outro.

Os sons são tão importantes para a vida e a sobrevivência que levaram Lilach Hadany, pesquisadora da Universidade de Tel Aviv, a indagar: E se não fossem apenas os animais que pudessem sentir os sons?—E se as plantas também pudessem? Os primeiros experimentos para testar essa hipótese, publicados recentemente no bioRxiv, servidor de estudos ainda não publicados, sugerem que, ao menos em um caso, as plantas conseguem ouvir e essa capacidade lhes confere uma verdadeira vantagem evolucionária.

A equipe de Hadany estudou prímulas-da-noite (Oenothera drummondii) e descobriu que, em questão de minutos após sentir as vibrações das asas dos polinizadores, as plantas aumentaram temporariamente a concentração de açúcar no néctar de suas flores. Aliás, as próprias flores agem como órgãos auditivos, captando as frequências específicas das asas das abelhas e ao mesmo tempo ignorando sons irrelevantes como os do vento.

O mais doce som

Por ser uma teórica da evolução, Hadany afirma que chegou a tal indagação ao perceber que os sons são um recurso natural universal—que as plantas estariam desperdiçando se não o aproveitassem como os animais. Se as plantas tivessem uma maneira de ouvir e reagir a sons, ponderou, isso poderia ajudá-las a sobreviver e passar adiante sua herança genética.

Uma mosca-das-flores marrom e amarela pousa em uma prímula-da-noite coberta de orvalho no Reino Unido.
Uma mosca-das-flores marrom e amarela pousa em uma prímula-da-noite coberta de orvalho no Reino Unido. FOTO DE MICHAELGRANTWILDLIFE, ALAMY

Como a polinização é fundamental para a reprodução das plantas, a equipe dela começou investigando as flores. A prímula-da-noite, que cresce espontaneamente nas praias e parques ao redor de Tel Aviv, surgiu como uma boa candidata, uma vez que possui um longo período de florescimento e produz quantidades mensuráveis de néctar.

Para testar as prímulas-da-noite em laboratório, a equipe de Hadany expôs as plantas a cinco tratamentos sonoros: silêncio, gravações de abelhas a uma distância aproximada de 10 cm e sons gerados por computador a frequências baixas, intermediárias e altas. As plantas que receberam o tratamento de silêncio — dispostas sob jarros de vidro à prova de vibrações —não apresentaram aumento significativo na concentração de açúcar no néctar. O mesmo resultado ocorreu com as plantas expostas a sons de alta frequência (de 158 a 160 quilo-hertz) e de frequência intermediária (de 34 a 35 quilo-hertz).

Contudo, nas plantas expostas a gravações de zumbidos de abelhas (de 0,2 a 0,5 quilo-hertz) e sons análogos de baixa frequência (de 0,05 a 1 quilo-hertz), a análise final revelou uma resposta inequívoca. Dentro de três minutos da exposição a essas gravações, a concentração de açúcar nas plantas apresentou uma impressionante elevação de 20%.

Um agrado extra aos polinizadores, teorizam eles, pode atrair mais insetos, possivelmente aumentando as chances de sucesso da polinização cruzada. De fato, em observações de campo, os pesquisadores constataram que a quantidade de polinizadores era mais de nove vezes maior ao redor de plantas que haviam sido visitadas por outro polinizador nos últimos seis minutos.

“Ficamos muito surpresos ao descobrir que tinha realmente dado certo”, afirma Hadany. “E, após repetir o experimento em outras situações, em outras estações e com plantas cultivadas em local fechado e ao ar livre, ficamos bem seguros sobre o resultado.”

Flores para os ouvidos

Quando a equipe refletiu sobre como funciona o som, por meio da transmissão e interpretação de vibrações, o papel das flores se tornou cada vez mais intrigante. Embora as flores tenham grande variação de formato e tamanho, uma boa parte delas é côncava e em forma de tigela, o que as torna perfeitas para receber e amplificar ondas sonoras de maneira bem semelhante a uma antena parabólica.

Para testar os efeitos vibracionais de cada grupo de testes de frequência sonora, Hadany e Marine Veits, coautora do estudo e universitária do laboratório de Hadany na época, colocaram flores de prímula-da-noite em uma máquina chamada vibrômetro a laser, que mede movimentos mínimos. A equipe então comparou as vibrações das flores com as vibrações de cada um dos tratamentos sonoros.

“Essa flor específica possui formato côncavo, então, em termos acústicos, faz sentido esse tipo de estrutura vibrar e acentuar a sua própria vibração”, afirma Veits.

E, de fato, foi o que aconteceu, ao menos para as frequências dos polinizadores. Hadany afirma que ficou animada ao observar que as vibrações da flor correspondiam aos comprimentos de onda da gravação de abelhas.

“Você nota logo de cara que deu certo”, conta ela.

Para confirmar que a flor era a estrutura responsável pelas vibrações, a equipe também conduziu testes em flores que tiveram uma ou mais pétalas removidas. Essas flores não ressoaram com nenhum dos sons de baixa frequência.

O que mais as plantas podem ouvir

Hadany reconhece que restam muitas perguntas sobre essa recém-descoberta capacidade de resposta das plantas ao som. Alguns “ouvidos” são melhores para certas frequências do que outros? E por que a prímula-da-noite deixa seu néctar muito mais doce se é sabido que as abelhas são capazes de detectar alterações mínimas na concentração de açúcar de 1 a 3%?

Além disso, essa capacidade poderia conferir outras vantagens além da polinização e produção de néctar? Hadany supõe que talvez as plantas alertem umas às outras sobre sons de herbívoros mastigando suas vizinhas. Ou talvez possam gerar sons que atraiam animais responsáveis pela dispersão das sementes da planta.

“É preciso considerar que as flores evoluíram junto com os polinizadores por um bom tempo”, afirma Hadany. “Elas são entidades vivas e também precisam sobreviver no mundo. É importante para elas a capacidade de sentir seu ambiente—sobretudo porque não podem se movimentar.”

Esse estudo único abriu caminho para um campo de pesquisa científica totalmente novo, que Hadany chama de fitoacústica.

Veits quer saber mais sobre os mecanismos subjacentes do fenômeno que a equipe de pesquisa observou. Por exemplo, quais processos moleculares ou mecânicos acionam a resposta de vibração e aumento do néctar? Ela ainda espera que seu estudo confirme a noção de que nem sempre é necessário um órgão tradicional do sentido para perceber o mundo.

“Algumas pessoas podem pensar: como é possível que (as plantas) possam ouvir ou cheirar?” Veits afirma. “É preciso entender que a audição não é exclusividade dos ouvidos”.

Richard Karban, especialista em interações entre plantas e pragas da Universidade da Califórnia em Davis, tem suas dúvidas, especificamente, sobre as vantagens evolucionárias que as respostas sonoras oferecem às plantas.

“É possível que as plantas possam sentir quimicamente suas vizinhas e avaliar se as outras plantas ao seu redor foram fertilizadas”, afirma. “Não há evidência de interações desse tipo, mas (esse estudo) deu o primeiro passo.”

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