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Rede Pantanal participa de Audiência pública sobre instalação de represas no rio Cuiabá (MT)

11 minutos de leitura

Por Breno Minervini Garcia Terra, biólogo e estagiário da Ecoa.

 

Na última sexta-feira (10), foi realizada, na Câmara Municipal de Cuiabá (Mato Grosso), uma Audiência Pública presidida pelos vereadores Diego Guimarães e Tenente Coronel Marcos Paccola. Na ocasião, membros da Rede Pantanal foram convidados a fazer explanações para os parlamentares acerca dos danos desses empreendimentos. O objetivo principal da audiência foi debater e discutir sobre a instalação de seis Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) no curso de 160km de extensão do rio. Na audiência, ouviu-se a população diretamente afetada, bem como especialistas no tema. Na fala de abertura, o presidente da Audiência ressaltou a importância histórica e cultural do Cuiabá: “Nossa cidade foi construída há 300 anos pela riqueza que o rio nos trouxe, como nosso próprio hino nos mostra, e agora o rio Cuiabá clama por cuidados”, lembrou ele.

O primeiro convidado a falar foi o professor Dr. Francisco de Arruda Machado (Chico Peixe). Em seu discurso, reiterou que nesse cenário de instalação das PCHs, teremos alteração nos padrões de comportamentos dos peixes da região afetada. Além do efeito negativo direto na ictiofauna, os maiores afetados serão as comunidades ribeirinhas que dependem do rio e de sua riqueza para sua substância. Segundo Machado, “Se houver a instalação, estaremos virando nossas costas à fonte de renda de milhares de pessoas, que já são ignoradas pelo estado, esfarelando a cadeia econômica de peixe e pesca”. O professor explicou que as espécies migratórias que vivem no rio estão em grande risco devido à falta de conectividade que a instalação das represas causa. Citou ainda o exemplo de Manso, explicando o antes e depois das construções de represas nesse rio e os impactos irreversíveis que foram causados ao bioma, causando um efeito direto na riqueza da região. Segundo o professor, “o rio Cuiabá sangra atualmente, e precisamos estancar esse sangramento, e o rio nos dará uma resposta à altura do nosso tratamento a ele.”

Seguindo na Audiência, tivemos o discurso do Vereador Bruno Rios, eleito pelo município de Várzea Grande (MT) e Presidente da União das Câmaras Municipais de Mato Grosso. Segundo o vereador, há um grande problema em Várzea Grande em virtude da falta do recurso hídrico. Ele destacou que, atualmente, a baixa do rio Cuiabá já afeta o abastecimento de Várzea Grande. “Precisamos pensar no futuro, entender todos os impactos causados pelas PCHs. Precisamos pensar nos netos dos nossos netos, que não podemos nos render à ganância dos grandes monopólios. Parabenizo a coragem de todos para enfrentar e fazer a diferença por essa e outras audiências futuras, que necessitamos chamar a atenção antes que seja tarde demais”, falou o vereador.

A Dra. Débora Fernandes Calheiros, membro da Rede Pantanal, também falou durante a audiência representando o Fórum Nacional da Sociedade Civil nos Comitês de Bacias Hidrográficas. Calheiros explicou que seguindo o Plano de Recursos Hídricos da região da Bacia Hidrográfica do Paraguai, já existe orientação de onde pode e não pode realizar as instalações de usinas hidrelétricas. Segundo a doutora “Se o Plano não for seguido, veremos resultados desastrosos, com ameaça à riqueza do Pantanal e com avanço do desmatamento nas bacias”. Calheiros salientou que as bacias já estão drasticamente comprometidas. “Temos que pensar na importância do fluxo livre entre os rios para as épocas reprodutivas e migratórias dos peixes, a única solução seria a construção acima de barragens já existentes, pois a instalação de novas barragens pode acarretar na perda de metade da riqueza de peixes dos rios, afetar a segurança alimentar e sustento de milhares de família que dependem da vida no rio, e estaríamos acabando com a reprodução de peixes migradores no rio Cuiabá”, explanou a pesquisadora.

Em sequência, a fala do Vereador Manuel Gonçalves representando a cidade de Nossa Senhora do Livramento (MT), ressaltou que o estado do Mato Grosso é um exportador de energia e portanto, para o Estado não seria interessante a construção delas, uma vez que o Mato Grosso só ficaria com os impactos negativos e a energia iria para outro local. Segundo o vereador: “Temos que olhar as 615 mil almas dependentes do nosso trabalho e esforços em preservar o rio. Não dependemos dessas PCHs e nem de suas energias. O estado de Mato Grosso não necessita disso e estamos cientes que isso é uma questão capitalista visando apenas o lucro e não passará pelo legislativo de Nossa Senhora do Livramento. O impacto causado por essas represas serão irreversíveis e causarão um enorme déficit na comunidade local dependente da pesca e do rio”.

Dando prosseguimento na audiência, ocorreu a fala de Nilma Silva, presidente da Associação do seguimento de Pesca. Silva demonstrou preocupação com os novos pedidos de empreendimentos energéticos na Bacia do Alto Paraguai, que construirão mais de 100 novas represas. Segundo ela: “O segmento da pesca repudia a construção dessas PCHs, pois precisamos combater a ação antrópica e ter ações de restaurações fluviais no rio, e não trazer um maior impacto negativo nessas 615 mil pessoas que vivem da pesca. Não precisamos de mais energia, necessitamos de cautela para apoiar decisões que iram impactar na vida das pessoas”.

Em subsequência, ocorreu a fala de Paula Isla Martins, pesquisadora da Ecoa e representante da Coordenação da Rede Pantanal. Martins alerta que esse tema é crucial para a conservação da vida na região e que segundo Estudos de avaliação dos efeitos da implantação de empreendimentos hidrelétricos, o rio Cuiabá seria um dos mais afetados, caso as represas sejam implantadas “A conectividade cairá de 93% para 15%, causando uma drástica redução na quantidade de peixes migradores, ou seja, aqueles que fazem piracema, na região. Afetando diretamente a pesca e todas as pessoas que vivem e sobrevivem dos rios”, salientou a pesquisadora. Em sua fala, ela ressalta que haverá ainda alterações no regime hidrológico do rio em escala sub-diária e nos do nutrientes e sedimentos carregados pelo rio. Todas essas barragens planejadas estão na chamada em “Zona vermelha” dos estudos, ou seja, zona de alto conflito sócio-ambiental, pois afetam drasticamente a ecologia geral da região e a população local. Segundo ela “A pergunta que temos que levantar é: Se temos um estudo robusto, realizado por mais de 80 pesquisadores, que indica que essa é uma área tão importante biologicamente, por que ainda se pretende implantar essas represas? O rio Cuiabá deve permanecer livre de barragens.”

Paula destaca ainda que a Rede Pantanal, em conjunto com outras redes está com uma petição pública com mais de 3 mil assinaturas, contra a implantação das represas no rio Cuiabá e lembra de que apesar do nome Pequenas centrais hidrelétrica, esses empreendimentos não são nada pequenos. “ Os impactos são enormes, não apenas para o rio Cuiabá, mas para todo o Pantanal.”, destacou ela. Martins lembrou e demonstrou apoio à iniciativas já existentes de projetos de Lei (PL) contra a implantação de represas. Tanto um PL específico para Cuiabá, elaborado pelo vereador Eduardo Magalhães, como o PL proposto pelo deputado Wilson Santos, que abrange todo o Estado de Mato Grosso.

A audiência pode ser acessada aqui.

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