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Agroextrativismo – Um método eficiente no combate à queimadas

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Altair de Souza do CEPPEC ministra aula sobre o baru (almendra chiquitana). Foto: Iasmim Amiden /Ecoa

Por Luana Campos – Ecoa

Reduzir e até mesmo substituir por completo o uso do fogo no manejo do solo é um desafio constante na produção rural. Um feito que já é possível, graças a métodos inovadores, que vem resultando em formas mais sustentáveis de produção, novas alternativas de renda, valorização de conhecimentos tradicionais, conservação ambiental, segurança alimentar e melhor qualidade de vida e dignidade para as pessoas do campo.

Há uma diversidade de técnicas, que não só evitam as queimadas como ajudam os proprietários rurais e comunidades tradicionais a utilizarem as propriedades e territórios comuns de maneira integral. Veja só:

Consórcio Silvopastoril associação entre pastagem e árvores [tornam a pastagem produtiva e protegem o gado]

Adubação verde – produção de matéria orgânica, por meio de podas de plantas, que é depositada sobre o solo [substitui o uso de fertilizantes nitrogenados]

Agroextrativismo – combinação de práticas agrícolas com a extração de produtos nativos baseado no manejo sustentável das espécies da região

Apicultura e meliponicultura – criação de abelhas nativas e/ou exóticas [é uma atividade de baixo impacto ambiental, com alto valor agregado que dispensa o uso do fogo]

Turismo rural e/ou ecológico – utilização do patrimônio natural e cultual de maneira sustentável [promove a vivência e o conhecimento da natureza, o reconhecimento e valorização de populações tradicionais e a proteção desses ambientes]

Com extrativismo, sem fogo

Em regiões de Cerrado e Pantanal, no estado de Mato Grosso do Sul, encontramos exemplos de como esses sistemas que substituem o uso do fogo são possíveis.

Um deles é o Centro de Produção, Pesquisa e Capacitação do Cerrado (Ceppec), uma associação de agroextrativistas localizada dentro do assentamento rural Andalucia, que trabalham com a coleta e o beneficiamento de frutos nativos do Cerrado, como o baru (Dipteryx alata) e o jatobá (Hymenaea courbaril).

Em conjunto com o extrativismo, atividades como a pecuária e o cultivo de árvores frutíferas são desenvolvidas nas pequenas propriedades, onde também é utilizada a adubação verde que mantém o solo protegido e produtivo durante o período de estiagem.

Hoje, o trabalho do Ceppec, envolve até mesmo grandes pecuaristas e produtores não associados, que mantém as espécies nativas na pastagem, além das cotas de reserva legal e APP (Área de Proteção Permanente). Por estar situado em uma área de grande importância hídrica – a alta bacia do rio Miranda – eles ainda atuam com ações de reflorestamento, promovendo a recuperação de nascentes e corpos d’água na região. Mais recentemente, o grupo começou a desenvolver atividades de turismo rural.

Altair de Souza, é agricultor familiar, e um dos diretores do Ceppec. Segundo ele, a forma com que a associação articula a prevenção das queimadas é positiva não apenas do ponto de vista ambiental, mas também econômico.

“Isso mudou nossa comunidade. De forma coletiva no Andalucia não há fogo há muito tempo, justamente por causa da dimensão da proposta de atingir toda a comunidade do nosso assentamento, e outras comunidades onde a gente trabalha com a questão do extrativismo sustentável.” (Altair de Souza, Ceppec)

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O agroextrativista do Ceppec, Altair de Souza, apresenta sua propriedade rural durante o WildFire 2019, maior evento do mundo sobre incêndios florestais. Foto: Luana Campos /Ecoa

Os polinizadores agradecem

Outra experiência bem sucedida de não uso do fogo é o Programa Oásis da ONG Ecoa. A iniciativa promove a salvaguarda de abelhas e outros polinizadores, aliando geração de renda, com a produção de derivados da apicultura e meliponicultura, e conscientização ambiental. Dessa forma os produtores rurais criam uma relação direta com a biodiversidade do entorno, e deixam de utilizar o fogo nas suas propriedades devido a intensa cooperação com a vegetação nativa.

Atualmente, o Oásis está presente em comunidades e assentamentos rurais de MS. Alguns exemplo são Vila Amolar, São Francisco e APA Baía Negra, no Pantanal, e o Assentamento Bandeirantes, em área de Cerrado.

As queimadas, juntamente com os agrotóxicos, são as maiores causas de mortandade de polinizadores no mundo – espécies de extrema importância para a produção de alimentos. Por isso, fogo e apicultura não coexistem.

Queimadas, um problema crônico

Apesar de – ainda hoje – ser uma prática regular, o uso do fogo no manejo do solo é considerado ultrapassado. A queima indiscriminada é um dos principais fatores que dão início à incêndios florestais, uma vez que iniciar o fogo é fácil, mas controla-lo é uma tarefa muito, muito difícil. Em 2019 os brasileiros sentiram na pele os efeitos negativos dos incêndios que afetaram Pantanal, Cerrado e Amazônia em níveis alarmantes.

A perda de biodiversidade e de ecossistemas; poluição do ar; danos ao patrimônio público e privado, como destruição de redes de energia e cercas; acidentes rodoviários devido a grossa fumaça que invade as estradas; o aumento dos casos de internação e mortes por problemas respiratórios, são alguns dos problemas que o uso indiscriminado do fogo pode desencadear.

Além disso, pesquisas mostram que a médio e longo prazo as queimadas – utilizadas para formar e renovar pastagens, fazer roças e promover a floração – empobrecem o solo, agravando processos de erosão.

Na análise do biólogo e diretor presidente da ONG Ecoa, André Luiz Siqueira, para que o cenário dramático de 2019 – que causou prejuízos incalculáveis ao Brasil – não se repita, é necessário que exista uma série de ações combinada: campanhas permanentes sobre os perigos das queimadas, capacitações de brigadas comunitárias, integração entre as atuações transfronteiriças dos países vizinhos, maior fiscalização e controle, e principalmente o fomento de atividades produtivas sustentáveis, “essa é para nós uma receita que poderia dar muito certo”.

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